quinta-feira, 21 de julho de 2011

Roda de capoeira no ICS

Um óptimo final para um excelente seminário.

Os videos são da Marta, que faz questão de afirmar que eles aceleraram bem, mas ela ficou mais interessada em ver e bater palmas. «Se queriam ver tudo, tivessem lá estado», acrescenta.

domingo, 17 de julho de 2011

Os pormenores!...

Entrevista de Carlos Serra

A propósito do próximo lançamento do seu livro Chaves das Portas do Social, o sociólogo moçambicano Carlos Serra concedeu uma elucidativa entrevista ao jornal O País.

A ler.

sábado, 16 de julho de 2011

4ª feira, seminário sobre Capoeira



A expansão, uso e modificações da capoeira na Europa são o objecto deste seminário, em que todos os oradores (sejam académicos ou não) são também praticantes.
O programa completo é o seguinte:

10h, auditório A. Sedas Nunes
. Raquel Lobão - Apresentação do projecto "Gingando para a Cidadania" e do "Juventude em Acção"
. Luciano Milani - De Mogadoro para o mundo: o jogo da capoeira no cyberespaço
. Mestre Carlão - Movement for change: Londres e o paradigma da Roda Global
. debate

11h45m, sala 3
. Aula e roda de capoeira

14h30m, auditório A. Sedas Nunes
. Ricardo Nascimento - Mandinga for export: a malandragem como capital simbólico na era global
. Kasia Kobolwska - The mobility of culture elements: capoeira in Poland
. debate

16h, auditório A. Sedas Nunes
. Filme Fly Away Beetle, seguido de debate com o produtor, Márcio Abreu

18h, sala 3
. Roda de capoeira e encerramento

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Lixando a vidinha à gente





Em parte, parece que a Moody's viu uma evidência. Afinal, não é necessário ser nenhum génio matemático ou contabilístico para concluir que a dívida pública portuguesa tem que ser re-escalonada, por ser impagável nas condições em que foi contratada.

Sobretudo aquela assumida nos últimos dois anos a juros surrealistas, na patética tentativa de sobrevivência política do anterior governo, procurando adiar o inevitável com tespestades de areia para os olhos, não dos tais de "mercados", mas dos eleitores.

Isto porque os tais "mercados", é claro, não estão ali para assegurar um simpático e seguro juro das suas aplicações financeiras (ou não se transaccionariam acções por preços que tornam miserável o dividendozinho anual, comparado com o rendimento noutros sítios onde pôr o dinheiro), mas para comprar e vender com lucro - ou seja, numa palavra de que não gostam, para especular.

Para os tais "mercados" (desculpem-me a evidência, mas é necessário repeti-la, já que os decisores políticos e económicos, seguidos de comentadores e media, regurgitam a vulgata marginalista mainstream que se ensina nas escolas onde os peões e barões dos "mercados" estudaram), é pouco relevante o valor real daquilo que transaccionam, ou o risco envolvido.

Se o valor intrínseco daquilo que compram e vendem fosse relevante (mas a teoria económica que partilham dogmaticamente diz que isso não existe, que só há valor no mercado), não teria acontecido a crise de 2008, de que andamos a pagar os prejuízos que eles tiveram.

Se os juros de dívida pública subissem por causa do maior risco de não se ser reembolsado e por ninguém o querer assumir, os tais de "mercados" não se acotovelariam para comprar cada emissão de dívida pública portuguesa, acotovelando-se tanto mais quanto maior for o juro que consigam sacar, suspostamente por ser maior o risco de incumprimento.

Risco pouco credível, aqui entre a gente, pois não imaginam a União Europeia a deixar cair um país do Euro em simples incumprimento de pagamento, mesmo que para isso tivesse que adoptar aquelas medidas óbvias que, chatice, tirariam aos bancos alemães e franceses em busca de re-capitalização este maná tão lucrativo - e, por isso, não foram até agora adoptadas.

Mas isso de o risco ser pouco relevante para os tais "mercados", é uma forma de dizer. Passa a ser uma coisa muito relevante quando serve para fazer subir o lucro a ganhar - se for dívida, o juro e as condições de transacção nos mercados secundários. É a comezinha lógica de "quanto mais eles estão à rasca, mais caro lhes podemos vender o dinheiro". Acompanhada de "quanto mais dissermos que é arriscado e mais exigirmos vender caro, mais eles ficam à rasca".

"Acalmar os mercados" é, por isso, a maior das imbecilidades politico-económicas repetidas à exaustão no último ano. Os tais de "mercados" não querem ser acalmados, querem abocanhar este maná nas mais lucrativas condições possíveis. Querem razões de nervosismo - ou porque não se faz nada contra o seu ataque, ou porque se aceitam medidas recessivas que pioram a situação, em evidente desespero de quem está à rasca.

Claro que me chateia que, no meio disto tudo, não haja como criminalizar as "agências de rating" que servem de desculpa e instrumento a isto, e os decisores que nos meteram e mantêm no buraco que continuam a cavar. Mas adianta resmungar?

Parece-me que a coisa tão pouco passa por resmungar a evidência de que esta mesma Moody's (e todas as congéneres) classificavam como AAA a Lehman Brothers e a Islândia, na véspera de falirem.

Também já não passa pela única coisa que teria evitado a situação, há um ano atrás - o resgate massivo, pelo BCE, de dívida pública dos países vulneráveis, antes vendida a juros incomportáveis. Mas, claro, como se iriam então os bancos alemães e franceses recapitalizar nestes tempos difíceis?

Por cá, passa certamente pelo rápido re-escalonamento da dívida.

E passa, caso a União Europeia queira estancar a hemorragia que é cada vez mais sua (não falemos de coisas esquisitas, como solidariedade, construção europeia e outras ideias ingénuas) pela urgente emissão de dívida pública europeia.

Nada de novo, como ideias. Mas não são mais evidentes a cada dia que passa?

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Prémio Gazeta para Sofia Lorena

Sofia Lorena, que muitos cidadãos de todas as classes sociais de Maputo conheceram durante as reportagens que aí realizou imediatamente a seguir ao 1 de Setembro de 2010, acaba de galardoada com o Prémio Gazeta da Imprensa, o mais importante prémio jornalístico português.

Não foi Maputo o motivo do prémio (é pena, para moçambicanos e moçambicanófilos...), mas a sua anterior série de reportagens acerca do Iraque ocupado.

Daqui lhe envio um grande abraço de parabéns!

terça-feira, 5 de julho de 2011

Elogio da Incomodidade

Deu entrada na gráfica o mais recente livro de Carlos Serra (figura mais que grada da sociologia e do bloguismo moçambicanos), que tive a inesperada honra de prefaciar.

O texto resultante é longo para um blog mas, para benefício dos eventuais interessados, aqui fica ele:

Este é um livro incómodo, escrito por um moçambicano incómodo.
O que, diria eu, é uma bênção para o leitor e para o país a que se referem as reflexões e análises que Carlos Serra aqui nos apresenta.
Permitam que me explique.
É muito cómodo, claro está, vivermos e olharmos para o mundo à nossa volta repetindo, a cada acontecimento desagradável ou perturbador com que nos cruzamos, algumas justificações prontas a usar, que parecem explicar de forma simples e tranquilizadora a superfície daquilo que vemos. Esta coisa aconteceu porque as pessoas são irracionais ou não sabem viver numa cidade, aquela ali porque se trata de algo natural ou porque sempre foi assim, aqueloutra porque interesses ocultos manipulam as pessoas, porque não se pode fazer melhor, ou porque «o moçambicano é assim mesmo». Justificações como estas têm ainda a cómoda vantagem de as ouvirmos ser repetidas por muitos outros à nossa volta, acabando por nos parecerem explicações de mero bom senso e uma confirmação do nosso próprio bom senso. Com um pouco de sorte, as justificações desse tipo até nos podem permitir ignorar os tais acontecimentos que nos perturbam, seja porque eles nos passam a parecer algo que faz parte da ordem natural do mundo, seja porque nos passam a parecer irrelevantes e fora da nossa responsabilidade. E podemos, comodamente, não pensar mais nisso - e menos ainda fazer alguma coisa.
Se somos cientistas sociais, o mais cómodo é, também, irmo-nos especializando naqueles temas que vão estando em destaque nas agendas de pesquisa internacionais, por aqui evidenciados através do súbito pulular de projectos financiáveis e de consultorias que, quantas vezes, têm até a cómoda gentileza de fornecerem já a conclusão desejada, subentendida ou explicitada no caderno de encargos. Entrados nesse cómodo terreno, é igualmente mais cómodo mantermo-nos nele, evitando incursões por assuntos arriscados, polémicos e conflituais que, para cúmulo, possam ser sensíveis e desagradáveis para os poderes instalados. Ou até, se necessário, dizer acerca desses tais temas difíceis aquilo que julgamos que alguma pessoa importante ficará satisfeita em ouvir-nos dizer.
Tudo isto é cómodo. Bem mais cómodo, certamente, do que pormo-nos a questionar, a analisar e a estudar questões como as que são abordadas neste livro.
Tudo isso é cómodo, dizia, mas tudo isso tem um preço.
No segundo quartel do século passado, o intelectual e activista italiano Antonio Gramsci foi cunhando, durante o seu encarceramento como prisioneiro político, a ideia de “hegemonia”. Ao longo das últimas décadas, temos ouvido muitos cientistas sociais e comentadores de todos os tipos encherem a boca com essa palavra, dando-lhe embora um sentido limitado e para o qual já existia uma outra expressão: “supremacia”. Um sentido limitado, quase um desperdício semântico, porque o sucessivo burilar da noção de hegemonia por parte de Gramsci - à medida que ia necessitando de a utilizar como ferramenta analítica - desembocou em algo bem mais relevante e útil, para olhar e pensar o mundo, do que uma palavra mais fina para designar “supremacia”. Hegemonia queria simultaneamente dizer, no final desse seu percurso, a reprodução e legitimação do domínio de um grupo com base no convencimento dos subalternos através de meios ideológicos e, por outro lado, a aceitação e integração pelos subalternos, na sua própria ideologia, da ideologia dos dominantes - que justifica e legitima a dominação de que estes gozam e de que os subalternos sofrem.
Digamos que é devido à hegemonia - nesses sentidos atribuídos por Gramsci - que são mulheres quem ensina as mulheres mais novas a submeterem-se aos homens, que ouvimos pessoas que não têm o suficiente para viver papaguearem que “sempre houve ricos e pobres”, que se atribua a riqueza à inteligência e empenho dos ricos e a pobreza à estupidez e preguiça dos pobres, ou que a ideia de “raça” e a diferenciação quotidiana em função dela ainda continuam a ser tão relevantes, em países há décadas libertados de regimes racistas.
Uma das consequências desse processo de hegemonia está lapidarmente expressa na frase de Steve Biko que o autor deste livro tem afixada no seu blog: «A mais potente arma nas mãos do opressor é a mente do oprimido.»
Outra consequência é especialmente importante num país como Moçambique, em que as pessoas estão submetidas a dois diferentes efeitos de hegemonia - por um lado, à pressão hegemónica dos países mais ricos e de matriz cultural euro-americana e, por outro, à pressão hegemónica dos grupos dominantes locais, decorra ela do poderio político, do económico ou da “tradição”. É que encarar os acontecimentos desagradáveis lançando mão, comodamente, dessas “ideias pronto-a-vestir” de que Carlos Serra também nos fala nas páginas deste livro, contribui para esconder as suas causas, para baralhar as suas lógicas, para desresponsabilizar os vários grupos dominantes - culpabilizando os dominados, o “exterior” ou a ordem natural do mundo. Contribui, afinal, para reproduzir e legitimar as relações de dominação e de desigualdade. E se, em vez disso, tentamos olhar para o lado e ignorar esses acontecimentos desagradáveis, o resultado é semelhante, pois o silêncio da sua fingida inexistência está já ocupado pelos hegemónicos lugares-comuns que, nesse caso, nos limitamos a não verbalizar.
Não deixa de ser verdade que os cientistas sociais e restantes intelectuais que olham para o lado e se continuam a dedicar apenas aos temas financiáveis das agendas internacionais, à medida que á sua volta ocorrem vagas de linchamentos, levantamentos populares, agravamentos das assimetrias sociais e das condições de vida da maioria, iniquidades praticadas em nome da tradição ou da modernidade, estão no seu direito de ficarem acantonados no seu cantinho. Como pessoas que são, estão de facto no direito de se centrarem naquilo que consideram ser os seus interesses, de buscarem assegurar o que consideram melhor para si e para os seus e de, para o fazerem, se resguardarem comodamente - seguindo apenas os caminhos sem riscos nem desafios já trilhados por quase todos os outros e evitando temas polémicos, politicamente sensíveis e que lhes possam trazer dissabores.
Mas, mais uma vez, isso tem os seus custos. Se as pessoas que tiveram oportunidade de aprender e de adquirir as ferramentas científicas que lhes permitem analisar as causas, dinâmicas e consequências dos fenómenos sociais para lá das aparências superficiais, dos lugares-comuns e das auto-justificações, não os utilizarem para analisar os problemas com que se confronta a sociedade, esses problemas não serão compreendidos para lá, precisamente, da superficialidade dos lugares-comuns. Ao não serem compreendidos, não poderão ser resolvidos nem minimizados de forma eficaz. Pior ainda, aquilo que é habitual quando os problemas não são combatidos, ou o são com base em preconceitos, é que eles se agravem e induzam outros, ainda mais complexos e graves.
É contra tais custos que se torna tão valiosa a capacidade de Carlos Serra nos incomodar.
Afirma-se frequentemente, com bastante leveza e razoável exagero, que os livros nos dizem mais acerca do seu autor do que sobre os temas abordados. Também no caso deste livro seria um abusivo exagero afirmá-lo. Mas não hesito em declarar que, na sua leitura acessível e diversidade temática, ele é um eloquente repositório da postura que Carlos Serra mantém na vida e nas ciências sociais.
Trata-se de um homem incomodado com as crescentes assimetrias sociais, com vidas concidadãs vividas no fio da navalha, com a violência (a do rio, mas também a das margens que o comprimem, conforme tantas vezes cita), com as justificações superficiais e desresponsabilizadoras, com a irrelevância a que são votados os mais desafortunados. Trata-se, suspeito-o, de um homem incomodado com o carácter incómodo que foram assumindo os valores de equidade e justiça social que nortearam a luta pela independência e nortearam a ideia daquilo que o país deveria vir a ser.
É também um homem que partilha a incómoda ideia de que os cientistas sociais têm responsabilidades perante a sociedade e que, para além dos temas das agendas importadas, deverão estudar e analisar aquilo que se passa diante dos seus olhos. Sobretudo se é de problemas, conflitos, tensões que se trata.
Mas é, ainda, um homem que não se limita a “achar que”, antes praticando aquilo que apregoa. Pratica-o em pesquisas académicas clássicas e pratica-o em directo, sem rede e de peito aberto à crítica e ao debate público que suscita, naquele seu blog que é carinhosamente crismado, por muitos dos seus leitores, como “Rádio Maputo”.
É, de facto, no Diário de um Sociólogo – espaço onde nasceram os textos deste livro - que milhares de leitores, moçambicanos e estrangeiros, melhor se sentem informados daquilo que se passa em Moçambique. Mas é também aí, e muitas vezes apenas aí, que os acontecimentos, fenómenos e problemas socialmente relevantes e incómodos (a par de mais alguns, que de outra forma se teriam tornado em não-questões, por efeito dos processos de naturalização e hegemonia), são levantados, abordados, analisados e escalpelizados, em interacção com os leitores.
A lista é impressionante e corresponde, afinal, ao índice deste livro. Permitam-me lembrar, contudo, que ela vai dos linchamentos às liturgias políticas, do Setembro de 2010 à condição dos cientistas sociais, das desigualdades económicas às representações do género e da africanidade, das violências sociais aos boatos e crenças significativos, da manipulação da história à marginalização da pobreza.
Ora as abordagens de Carlos Serra a temas e fenómenos como estes incomodam a paz podre do ”não vamos pensar nisso”. Não pensar e não falar porque, dizem uns, essas coisas são muito complicadas e só se pode discuti-las depois de amplas recolhas de dados, que não têm qualquer intenção de algum dia vir a fazer. Ou porque, contrapõem outros, tudo isso é já claro, bastando os tais lugares-comuns prontos a usar para que compreendamos o que se passa. Ou ainda porque, ameaçam terceiros, falar de fenómenos desagradáveis é lançar gasolina sobre o fogo - como se, conforme comentava com ironia o meu colega Emídio Gune, um médico estivesse a espalhar uma doença por dizer a um paciente que ele a tem. Ou finalmente porque, sussurram muitos, falar de fenómenos sensíveis pode desagradar a quem manda.
O nosso autor confrontou alguns desses raciocínios e atitudes, não atribuindo a outros deles a dignidade merecedora de resposta.
Independentemente de tais incomodadas críticas, é evidente que os efeitos do seu labor têm um valor social incalculável. Ao expor e abordar com seriedade analítica esses assuntos, Carlos Serra abana e faz ruir a cómoda possibilidade de os ignorarmos, ou de os encararmos á luz da displicência dos lugares-comuns, caso prezemos a nossa integridade intelectual e cidadã. Ao mesmo tempo demonstra, pelas próprias análises que faz, que tais questões podem ser abordadas de forma aprofundada, séria, e em respeito pelos critérios científicos.
Claro está que, onde há duas cabeças de cientistas sociais, haverá certamente duas sentenças, por vezes complementares, por vezes antagónicas. Também o leitor poderá concordar ou não com cada uma das análises e conclusões que se sucedem ao longo deste livro. Mas de duas coisas poderá estar certo: uma, da honestidade intelectual com que essas análises foram feitas; outra, de que mais vale haverem duas, cem ou mil sentenças acerca de um problema relevante do que não haver nenhuma, por nos termos resguardado na nossa comodidade e ninguém se ter dado ao trabalho de nos incomodar. Não sei, aliás, se o mais importante é concordar com o autor, ou ter sido por ele incomodado a pensar nesses assuntos e a fazê-lo com profundidade, seriedade e espírito crítico.
Daí decorre, afinal, um outro valioso efeito do trabalho de Carlos Serra e da incomodidade que ele suscita.
Com uma carreira docente que praticamente acompanha o Moçambique independente e que assistiu à formação e consolidação de um já numeroso conjunto de cientistas sociais de elevada qualificação e potencial, não se limitou a ensinar aos seus alunos autores que pudessem comodamente papaguear. Procurou instigar-lhes a autonomia e a capacidade crítica e analítica, aplicadas a questões socialmente relevantes, com os pés bem assentes na aprendizagem do terreno e em conhecimentos teóricos, entendidos como ferramentas do ofício de quem quer compreender, e não como receitas que substituem o processo de compreensão. Essa preocupação, tão bem expressa no capítulo 76 deste livro, «Riscos espreitando os jovens cientistas sociais moçambicanos», tem sido prosseguida, de forma eventualmente ainda mais intensa, na orientação dos jovens investigadores que foram colaborando nas suas pesquisas, no Centro de Estudos Africanos. Quero crer que essa incómoda acção de décadas sairá, em numerosos casos, vencedora dos cómodos riscos contra os quais o autor nos alerta. Mas estou certo de que, em cada novo sociólogo livre que venha enriquecer o seu país, abordando com profundidade e seriedade problemas relevantes da sociedade moçambicana, estará uma quota-parte da herança de incómoda acção e exemplo de Carlos Serra.
No entanto, ao sair das fronteiras da universidade e discutir com o público as suas “notas de reflexão e pesquisa”, como lhes chama, o nosso autor alargou a sua herança bem para lá do espaço académico. Alimentando incansavelmente o seu blog, sempre aberto ao debate, ele instiga muitos e muitas, jovens e menos jovens, com formação superior ou sem ela, a não se contentarem com a comodidade das desculpas fáceis e dos lugares-comuns, da desresponsabilização social e da resignação. Instiga-os a serem mais exigentes consigo próprios e com os outros. Instiga-os, afinal, a serem mais livres e cidadãos.
É caso para pedir: «Continua a incomodar-nos, Carlos!»

segunda-feira, 4 de julho de 2011

É hoje!

Uma hipótese que merece reflexão:

Será que as mulheres moçambicanas se dividem em dois mundos, o das modernas e com estudos, que dormem, e o das restantes, que se deitam depois de todos lá em casa e se levantam antes do sol?

Para além do exoticismo made in Maputo dessa reportagem no "meu" bairro do Xipamanine, há sempre, claro está, a questão de se tomarem as consequências por causas.
Mas - diz alguém que viveu e estudou gente que trabalha por turnos - não valerá a pena pensar se essas consequências circadianas não poderão ser, por sua vez, causa de consequências insuspeitadas?


(o alerta veio, claro, do Carlos Serra)

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Tudo bem, desde que eu continue a gastar à tripa-fôrra e vocês paguem a factura, lá no contnênte

O inefável Alberto João Jardim diz que concorda com o roubo do Subsídio de Natal, porque prefere um governo cruel a um governo mentiroso.

A gente até as adivinha...



Vai uma aposta que, este ano, os administradores das empresas não vão ter Subsídio de Natal, mas "prémios de produtividade" mais chorudos?

E que a lei que sustentará o novo imposto vai ser escrita de forma que torne possível fazê-lo?

Pois...

Há quem fale


Excertos da entrevista ao Savana de Severino Ngoenha, o primeiro filósofo moçambicano que tive o prazer de conhecer e de ter por colega, já em finais do século passado:



"Quando vejo certas práticas a que se prestam certas elites moçambicanas, como acordos de parceria com empresas ou indivíduos sem escrúpulos, pergunto-me se o discurso é diferente do discurso de António Enes (...) todo o sistema de dominação do nosso povo contou sempre com a cumplicidade de grupos entre nós (...) Então, ao mesmo tempo que o número e a qualidade de carros carros de luxo aumenta na cidade (...) o número de pobres, de miseráveis, não cessa de aumentar (...) Se a questão é dinheiro, então somos mais baratos que os nossos predecessores. Temos de lembrar que uma espingarda no século passado era mais difícil de construir que um Mercedes hoje (...)."