sábado, 30 de junho de 2007

Bom para Lisboa - 2

Mas, infelizmente, o que de mais grave está em causa não são fluxos de trânsito, lugares de estacionamento e mais uns quilos de dióxido de carbono (e etc.) no ar.
Parecemos esquecer que grande parte da baixa está assente sobre água, que em cada um dos vales que separam as célebres 7 colinas correm ribeiras hoje subterrâneas, e que a água encontra sempre forma de passar. Se lhe tapam o caminho (por exemplo, com um enorme túnel de betão), irá corroer à volta o que antes era terreno firme, sem que se possa prever com certeza onde, quando e com que consequências para o que está edificado em cima.
Para mais, duvido que alguém saiba, hoje, qual o percurso preciso dessas ribeiras.

Alexandre Quintanilha tornou-se o divulgador em Portugal de uma curiosa teoria acerca dos riscos tecnológicos: a natureza é robusta. Quer isto dizer, basicamente, que aguenta com as asneiras tecnológicas e tecno-científicas que formos fazendo, pelo menos até que os autores das asneiras (ou outros seus colegas) descubram uma solução ou um paliativo para o mal que foi feito.

Parece que a mesma profissão de fé guiou, e continua a guiar, estes esburacanços em Lisboa. Com as diferenças de que nem sequer previsões sérias de impacto são feitas, e de que essa fé na natureza e na capacidade dos técnicos está, neste caso, mal colocada.
A natureza poderá ser robusta, acabando mais tarde ou mais cedo por levar à frente terra, rochas e mesmo túneis; mas o que cá está em cima, a tal cidade em que vivemos, só tem a robustez que a natureza em que assenta lhe deixe ter. E pode ruir.

Mas parece, também, que nada disso importa, desde que mais 14.000 carros possam entrar por dia - ou qualquer outra coisa "boa para Lisboa".


E, depois, há sempre a possibilidade de uma nova fé, num futuro com oníricas Lisboas venezianas, como as imaginadas por António Gonçalves e Nuno Silva, nas aventuras de Filipe Seems.

Sem comentários: