Muito menos quando se trata de eleições uninominais, como as que temos para Presidente da República.
Aí, é necessário que um candidato seja plausivelmente capaz de agregar, em torno da sua mensagem e figura, forças políticas e (cada vez mais) cidadãos comuns como nós.
A não ser que se queira, apenas, marcar posição de uma qualquer pureza ideológica ou de uma qualquer particularíssima visão da sociedade, independentemente de esperados resultados marginais naquilo que é, afinal, uma eleição.
E em que, sendo-o, a ideia é eleger alguém ou, pelo menos, discutir essa vitória e, de caminho, marcar a agenda do debate público com aquilo que se considere mais importante e essencial.
De cada vez, a questão é mais complicada à esquerda, sempre mais dada, historicamente, a enfatizar as suas diferenças, mesmo antes de o maior partido dessa área ter abraçado, como uma inevitabilidade mas de sobrolho franzido, políticas e práticas mais liberalistas do que as de muitos conservadores.
Um pouco por tudo isto, não me impressionava quase nada, há uns 2 ou 3 meses atrás, vir a votar numa figura de que pouco esperava, mas que expressava uma simpática cultura de esquerda e não levantava particulares anti-corpos sociais, como Manuel Alegre.
Acontece que muita coisa ocorreu desde então.
E também que ouvi hoje, logo de manhã, Manuel Carvalho da Silva na SIC.
Já o tinha ouvido dizer coisas semelhantes ao que agora ouvi.
E suponho que dirigentes dos partidos mais à esquerda as tentem também dizer - ou, pelo menos, concordem com elas.
Mas a verdade é que, se o tentam, não o conseguem fazer de forma eficaz. Como é verdade que, sempre que os tenho ouvido, costumam lançar pedaços desconexos de uma avaliação da realidade, dos problemas e dos caminhos que, se pode ser que exista enquanto um todo coerente, não chega a quem os ouve. Fica o slogan e a opinião casuística.
Hoje de manhã, Carvalho da Silva transmitiu, como se de apenas uma mera questão de bom senso se tratasse, a visão global de uma alternativa socialmente justa à situação actual.
Sempre ancorada em questões e exemplos concretos, mas sem se limitar a eles ou, muito menos, a slogans, a receitas keynesianas, à mera posição defensista dos direitos dos trabalhadores, ou a isolacionismos serôdios.
E desmontando, de forma acessível e sistemática, os irracionais ou injustos pressupostos que formatam, como se de evidências ou inevitabilidades se tratasse, as novas histerias orçamentais e "reajustadoras". E os absurdos que sustentam esta possibilidade de tornar os estados e a União Europeia reféns dos especuladores financeiros.
Não me surpreende essa capacidade de falar, de forma sintética, acessível e integrada, do global e do local, de justiça social básica e de constrangimentos externos, de opções políticas nacionais, europeias e dos mercados financeiros, de falácias económicas e de necessidades sociais.
É um homem que, para desempenhar o melhor possível as suas responsabilidades sindicais, teve que projectar o olhar para lá do mero defensismo e da lógica das fronteiras nacionais, apostando na reflexão crítica glocal, pondo a análise à frente do jargão e partindo dos seus valores sociais.
Mas tive hoje de manhã a completa certeza de que, em Maio de 2010, já não nos chegam (não apenas a mim, ou à tal de "esquerda", mas aos nossos concidadãos que não engordam à conta da crise) candidatos com uma simpática cultura de esquerda e um saudável desagrado pelas desigualdades sociais.
Já não nos chegam figuras que, afinal, partilhem os pressupostos falaciosos que, a nível financeiro e económico, regem as "respostas à crise", ou que nem partilhem nem deixem de partilhar, porque nem sequer pensam nisso.
É necessário, nas presidenciais, que alguém diga o precisa de ser dito - e que Carvalho da Silva hoje disse.
Não para que, simplesmente, se ouça.
Mas para que, ao ouvir-se, se quebrem os consensos sobre supostas inevitabilidades e sobre regras do jogo que só existem porque os estados e as instituições internacionais as deixaram instalar e deixam vigorar. Em grande medida, precisamente, porque partem dos mesmos pressupostos falaciosos dos senhores da crise e dos mercados financeiros; outros, porque não param para pensar e para aprender com o que se passa à sua volta.
Não é qualquer pessoa que o possa dizer ou, sobretudo, criar esse efeito.
Não é qualquer pessoa, tão pouco, que possa, com o seu prestígio trans-partidário e a sua mensagem, enfrentar Cavaco Silva com plausibilidade de sucesso, apesar dos tiros no pé que este vai dando.
O candidato que mobilize a esquerda, para lá das fronteiras partidárias ou de quem nelas não se reconheça, não tem que sair de uma franja do PS.
Mais que isso, não o conseguirá fazer, hoje, com pensamento e discurso de ontem.
É por tudo isso que digo
«Carvalho da Silva à presidência!»
E é por tudo isso que desejo que ele me ouça, que muitas mais pessoas o digam, e que os dirigentes partidários nos venham a ouvir.
7 comentários:
Caro professor, gostaria de saber se tem recebido os meus mails.
Enviei 2 mails para os quais não obtive resposta, um no dia 15 e um outro hoje.
Tenho usado o endereço deste blog porque é o unico de que disponho mas não percebo se chegaram ao destino.....já é habito o meu mail dar problemas nesse aspecto...
Ass: Pedro Leal
Já lhe respondi, no endereço que todos os seus colegas usam.
Paulo,
Se ele resolver candidatar-se também terá o meu voto!
Vamos criar um movimento de apoio!
Abraço,
João Areosa
Caro Paulo
Pela pertinência do seu post, e por considerar que se trata de uma visão muito aproximada das necessidades de país e deste povo, tomei a liberdade de incluir no meu blog o link para o seu blog.
Espero, que continue a colocar post de tanta qualidade como tenho tido oportunidade de constatar.
Saudações académicas
Cláudio Santiago
Caro Paulo
Pela pertinência do seu post, e por considerar que se trata de uma visão muito aproximada das necessidades de país e deste povo, tomei a liberdade de incluir no meu blog o link para o seu blog.
Espero, que continue a colocar post de tanta qualidade como tenho tido oportunidade de constatar.
Saudações académicas
Cláudio Santiago
Obrigado.
Caro Paulo,
estou em 95% de acordo consigo. Penso no entanto, que será, tarde de mais. Penso nisso desde que, há coisa de uns dois anos, um antigo camarada de trabalho, há muito reformado, com pouca instrução, mas com a sabedoria quem já ultrapassou os 80, anos me disse que o "Manel Carvalho da Silva é um grande homem. Daria um excelente Presidente da República..."
Desde aí que sinceramente - sempre esperei que, depois das tropelias que o aparelho estalinista do PCP lhe tem feito, o BE (em quem tenho votado) fizesse com ele um qualquer acordo no sentido de uma candidatura.
Receio que para as próximas presidencias a sua iniciativa já venha um bocado tarde. Digo-lhe isto com o desconforto de quem se espera que engula o sapo do candidato apoiado pelo BE e pelo arauto do neoliberalismo e se recusa a fazê-lo... não o farei. Não que Cavaco e Alegre sejam a mesma coisa, mas Cavaco e Sócrtes são a face da mesma moeda e votar no mesmo candidato que o actual p-m apoia vai contra a minha ideia do que é uma "esquerda grande" enraizada nos movimentos sociais...
Mas, quem sabe?, talvez aqui esteja a nascer uma vaga de fundo para as seguintes. Vou ficar atento.
Obrigado
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