A tão propalada competitividade das empresas portuguesas (das que produzem alguma coisa, entenda-se) é sobretudo prejudicada por 3 factores modificáveis a nível local:
Por um lado, pela organização de trabalho e qualidade de gestão, já que somos daqueles que trabalham mais horas e dias na União Europeia, sendo a produtividade relativamente baixa.
Por outro, e excepto nalgumas áreas, pelos produtos oferecidos e sua rápida adaptação às expectativas dos consumidores. Afinal, se pomos a potencial mão-de-obra mais qualificada a vegetar precariamente em call centers, ou a mandamos emigrar, também não se fazem omoletes sem ovos...
Por fim, pelo custo elevado de diversos factores de produção, entre os quais não se inclui o trabalho - comparativamente barato, tal como aliás as contribuições patronais para a segurança social. Mas onde se inclui, de forma relevante para qualquer actividade económica e fulcral para muitas delas, a energia.
Energia que, claro está, também é essencial para cada um de nós e cuja necessidade e preço ainda se tornam mais importantes nestes tempos de alterações climáticas, marcados por frios mais frios e por calores mais quentes.
Se os exagerados preços energéticos pesam sobre as empresas portuguesas e a sua competitividade, pesam também (e muito, como bem sabemos ao olhar para a factura) nos nossos orçamentos domésticos, no nosso bem estar e, em última instância, na nossa saúde.
Justificar-se-ia, aliás, estudar urgentemente em que medida o incrível aumento de mortalidade neste inverno, em comparação com os anteriores, se deve não apenas ao impacto das políticas de austeridade sobre a quantidade e qualidade do consumo alimentar, mas também ao prosaico facto de que muito gente não tem condições para pagar o aquecimento de que necessitaria, num país em que as casas não estão preparadas para o frio.
A lógica e a experiência sugerem que a ligação entre esses factores e a mortalidade deverá ser muito directa. Perante ela, falar do aumento das gripes letais nestes meses que passaram equivale a dizer (e, em sentido estrito é verdade) que ninguém morre de SIDA; morre-se é de doenças a que o SIDA fornece as condições para se tornarem mortais.
Neste quadro, é relevante que o falatório se concentre nos subsídios às energias renováveis e não no facto de esses subsídios "estatais" serem pagos pelos consumidores, de eles serem estrategicamente importantes e mais ajustados do que outros concedidos a tecnologias poluidoras, ou de os preços da própria energia serem já exageradamente altos, e agora agravados por uma tributação de IVA inconcebível num produto económica e socialmente essencial.
Mas que, também neste quadro, um secretário-de-estado da energia se demita depois de considerar os preços da energia "exageradamente altos" e tentar intervir a esse nível, sendo de imediato substituído pelo senhor que (na presidência da instituição respectiva) dava o aval a esses preços, é todo um programa.
Todo um programa político, económico e social. Mas também de saúde pública.
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