domingo, 19 de outubro de 2008

Acidente químico em Estarreja


Como tantas vezes acontece, a notícia é lacónica e está enfiada num cantinho (o "Local", que parece ser tudo o que o caso merece).
De facto, são coisas "normais" e "pouco relevantes", se não se dão à frente de uma multidão, nem estão interesses urbanísticos em causa.

Uma fuga de anilina em estado gasoso, no complexo químico de Estarreja, provocou 14 vítimas.
Dos 3 casos mais graves, um já teve alta, o outro é considerado "estável", pelo que o terceiro estará em risco de vida.

A informação é dada pelo Comando Distrital de Operações de Socorro, sendo provável que ninguém vá perguntar à empresa em causa o que aconteceu e porquê.

7 comentários:

Anónimo disse...

Viva Paulo,
Qualquer dia (nunca antes do próximo ano – 2009 -, pois até lá irei andar com o tempo cronometrado ao segundo!) hei-de desafiá-lo para lançar no antropocoiso um fórum/debate sobre os acidentes (maiores e/ou menores). Aqui fica uma primeira prospecção à sua eventual receptividade acerca deste tema/assunto.
Um abraço.

(Paulo Granjo) disse...

Claro que sim.

Só temos que assegurar que possamos acompanhá-lo com umj mínimo de disponibilidade de tempo.
Pela minha parte, envergonho-me de dizer que há mais de um mês que não espreito o "Risco em debate"...

Mas no início de 2009 a coisa já deve estar mais leve, também para os meus lados.

Já agora, pode alargar-se a discussão às propostas de Lagadec acerca das situações de crise.

Abraço

Anónimo disse...

Nesta fase da minha vida a questão do tempo está difícil... mas para um bom debate de ideias tem de haver tempo!
Eu também tenho alguma vergonha por ter deixado algumas questões em aberto e/ou sem resposta, mas qualquer dia voltarei “à carga”!
As situações de crise, bem como a sua gestão, parece-me uma excelente ideia (até porque depois dos acidentes maiores tem de haver uma gestão de crise), mas confesso que os meus conhecimentos sobre esta matéria são diminutos.
Um abraço e obrigado por aceitar a proposta!

(Paulo Granjo) disse...

A ideia é um bocadinho menos optimista.
Parte do princípio de que nem todos os acidentes levam a situações de crise (como ele as define), mas que na maioria dos "acidentes maiores" isso acontece.

Não tenho nenhum dos livros dele comigo mas, de memória e no essencial, é mais ou menos isto:

A "crise", na proposta do Lagadec, ocorre quando os mecanismos de resposta ao acidente que foram previstos (baseados numa fragmentação cartesiana dos problemas, concebidos isoladamente) não só se revelam incapazes de reagir eficaz e adequadamente às situações (num contexto em que dinâmicas de interacção complexa entre problemas surgem de forma inesperada e confusa), como acabam por constituir, eles próprios, factores de agravamento da situação.

Assustador?
Há depois uma outra linha de pessoal especializado em "prever o imprevisível", como dizem - ou, de forma mais correcta, em preverem todo o tipo de "granel", de disfunções, de falhas técnicas e comunicacionais que irão plausivelmente ocorrer durante a aplicação de um plano de emergência a uma emergência real, preparando soluções redundantes ou que as torneiem.
Mas como nem tudo se pode conceber a priori e como também sistemas de segurança e de resposta redundantes podem sofrer disfunções e falhas técnicas redundantes, a coisa dá realmente pano para mangas.

Anónimo disse...

Paulo,
Confesso que conheço apenas uma pequena parte da obra de Patrick Lagadec. Mas essa noção de crise parece-me muito bem concebida. Seguramente que irei procurar conhecer melhor esta perspectiva. Já agora, tem alguma referência bibliográfica que me possa indicar?

É assustador, sem dúvida; mas não é surpreendente (pelo menos para mim).

Há um autor (Charles Perrow) que eu aprecio particularmente e que discute precisamente essa questão da redundância e dos problemas associados è utilização deste tipo de mecanismos nos sistema de protecção e segurança organizacionais. Ele defende a ideia que os sistemas redundantes tornam o próprio sistema mais complexo e “estreitamente” interligado e que a utilização de sistemas redundantes aumenta a possibilidade de ocorrerem falhas “indetectáveis”. Este autor foi fortemente criticado por colocar em causa a utilização de determinados tipos de tecnologias (devido aos altos-riscos que incorporam), bem como por chamar “documentos fantasia” a alguns documentos organizacionais (do tipo planos de emergência ou planos de evacuação), devido à forma “deficiente” como eles são utilizados nas organizações.

Infelizmente, não conheço muita gente cá em Portugal que se possa juntar a este debate, mas talvez o Paulo esteja melhor posicionado para recrutar membros para a discussão (que pelo andar da carruagem... promete)!
Um abraço!

(Paulo Granjo) disse...

Oh João! Duvido que sejamos as únicas pessoas cá no burgo a ter dado atenção ao "Normal Accidents". Afinal, é um clássico incontornável.

Quanto ao Lagadec, o artigo que me parece mais informativo acerca dessa questão chama-se "l'action en situation de crise" e está num tijolo imenso coordenado por Fabiani e Theys, chamado "La Société Vulnérable: évaluer et maîtriser les risques". O livro já foi publicado há uns 20 anos pelas Presses de L'École Normale Supérieure, pelo que talvez se encontrem online os artigos.

Talvez seja mais fácil de encontrar um outro artigo, que saiu em Agosto de 84 nos "Annales des Mines" e se chama "Le risque technologique majeur et les situations de crise".

Não vou jurar (porque emprestei esse livro e levou sumiço), mas creio que a questão também é abordada num livro dele publicado pela Seuil, que se chama "La civilisation du risque - catastrophes technologiques et responsabilité sociale".

Se não conseguir encontrar nenhum dos artigos e a questão lhe interessa muito, entre em contacto pessoal comigo, que a gente encontrará forma de dar um jeito.

Anónimo disse...

Olá Paulo,
Não quis dizer que seriamos os únicos em Portugal... quis apenas dizer que no meu leque de conhecimentos (amigos e colegas) não conheço ninguém que se interesse por esta temática (e isto seria apenas uma oportunidade para os desafiar a entrar no debate dos acidentes e das situações de crise de modo a ampliar a discussão).

Acredito que seja ignorância da minha parte, mas confesso que não conheço nenhum autor português que fale sobre os “acidentes normais” (além do Paulo, claro). Conhece alguém?

Obrigado pelas três referências de Lagadec. Afinal, dos 3 só não tenho 1 ("Annales des Mines" e se chama "Le risque technologique majeur et les situations de crise").

A tese de doutoramento dele ("La civilisation du risque - catastrophes technologiques et responsabilité sociale") creio que não fala sobre este assunto (estive agora mesmo a ver o índice, pois podia ter tido um lapso de memória).

Do “tijolo imenso” que tem quase 700 páginas ainda não li todos os artigos (e este de Lagadec foi um deles), mas já vai hoje para casa (apesar da “lista de espera” não ser pequena!). De facto, este tijolo, apesar da idade, continua a ser uma obra fantástica e incontornável para quem se interessa por este tema.

Qualquer dia entrarei em contacto consigo, para nos conhecermos pessoalmente (afinal de contas até trabalhamos na mesma cidade).

Um abraço e obrigado pela disponibilidade demonstrada.