domingo, 29 de março de 2009

Ó p'ra nós com uma igreja civilizada!

No seguimento da tomada de posição do Bispo de Viseu, o Bispo das Forças Armadas veio defender que «proibir o preservativo é consentir na morte de muitas pessoas» e que as pessoas que aconselham o Papa deviam ser «mais cultas».

Mais comedido, o Bispo do Porto não deixou no entanto de afirmar que, se a grande solução para o problema da sida é comportamental, o preservativo é um «expediente» que poderá ter «o seu cabimento nalguns casos».

Face às posições indiscriminadas do actual Papa e ex-Inquisidor-Mor (que obviamente, ao contrário das cores com que o quiseram pintar, não é tolinho nem desbocado e pensa mesmo aquilo que diz), dá vontade de a gente deixar cair o queixo e esclamar:

Ó p'ra nós, com uma igreja civilizada!

sábado, 28 de março de 2009

Ainda o excomungam

Soube hoje, num telejornal da hora do almoço, que um senhor exortou os(as) seropositivos(as) a usarem preservativo, caso decidam ter relações sexuais.

E perguntam vocês: isso é notícia?
Não é uma coisa do mais comum bom-senso e sentido de humanidade?
A disseminação deliberada de doenças mortais não está, para além do mais, criminalizada?
E, a fazer-se uma exortação, ela não deveria ser alargada aos seronegativos?

Pois é.
Mas acontece que o tal senhor tem como profissão ser Bispo de Viseu.
Portanto, esta tímida e consensual exortação ganha um peso totalmente novo e torna-se merecedora de elogio. É a vida.

Assim como assim, ainda excomungam o homem...

sexta-feira, 27 de março de 2009

Os cavalos a correr...

Começou, na Austrália, o mundial de fórmula 1.
E, a julgar pelos treinos, com as cartas muito mais baralhadas.

Com um abraço ao Zé Paulo, aqui ficam os meus desejos de que tudo se decida nas pistas e de que, já que os carros ficaram mais feios com as novas regras, isso ajude a vermos coisas parecidas com estas.

Detroit 1990



Donington, 1993




Dijon 1979

quinta-feira, 26 de março de 2009

Neo-neo-colonialismo


Pode bem ser que nos edifícios construídos em África por empresas chinesas os tectos não sejam de fiar e os fios eléctricos se derretam dentro das paredes, ou que as pontes que constroem tenham a aborrecida tendência para cair.
Pode bem ser que importem trabalho semi-escravo do Celeste Império e que sejam mais racistas do que qualquer nacionalidade que passe por África.
Pode bem ser que pilhem as matérias-primas, sem terem que se preocupar com outro indirect rule que não no campo dos negócios.

Mas a China põe montes de 'massa' em África e tem uma postura "muiiito prááática" quanto à eventual necessidade de parte desse dinheiro servir para "agilizar" os negócios, ou acerca da forma como os governantes tratam a população - desde que a controlem e os tais negócios fluam.

E damos connosco a verificar que mesmo a África do Sul, o gigante económico africano, nega vistos ao Dalai Lama, para não prejudicar as relações com o Grande Irmão do Leste.

Isto está bonito...

Dramas for all seasons

Gostava de descobrir quem é @ brilhante estratega que organiza a agenda de temas políticos da líder do PSD.

Agora, com o Freeport nas bocas do mundo e um transfuga do partido a ser julgado por corrupção, afivela o ar severo do costume e vem revelar-nos que «a corrupção é um grande constrangimento ao desenvolvimento do país», e que «essas questões dos licenciamentos, das autorizações, das burocracias, são fonte grande de corrupção».

Para além do carácter estraordinariamente inovador da segunda afirmação, que ninguém nunca tinha ouvido na vida, esta declaração e o seu timing levantam umas duvidazitas.

Não é que a corrupção não seja, sempre, um assunto muito grave e, sobretudo, uma imensa obscenidade. Claro que é.
Mas não será um pouco desajustado culpá-la pela falta de desenvolvimento em Portugal?
E porque não, já agora, pela crise económica portuguesa que precedeu em muitos anos esta crise financeira, ou pela incapacidade de aplicar os fundos europeus na construção de uma economia desenvolvida e sustentável, que se vem ininterruptamente arrastando desde os governos de Cavaco Silva até à actualidade?

Depois, o timing parece um bocado descarado. E o que é evidente de mais, a malta desconfia. E pergunta-se.

Trata-se de uma tentativa um bocado canhestra de aproveitamento do que vai estando nos jornais?
Ou será que Manuela Ferreira Leite decidiu emular sua santidade o papa?

Também no caso dela, contudo, temo que lhe faltem alguns atributos para vir a ganhar o concurso de Miss Qualquer Coisa.

Habitação contra a crise

O governo Lula anunciou a construção de 1 milhão de habitações sociais, sobretudo no sul (S.Paulo e Rio de Janeiro) e no nordeste.

Como a medida não busca apenas equidade social e melhores condições para uns milhões de pessoas desfavorecidas, mas também estimular a área da construção civil, é de esperar que seja bem recebida até pelos mais ricos - ou, pelo menos, de forma mais consensual do que as medidas "despesistas" e "subsídiodependentes" que permitiram reduzir o número de pobres no Brasil, ao longo dos últimos anos.

quarta-feira, 25 de março de 2009

O país dos estagiários

José Sócrates descobriu a solução para a crise e a competitividade nacional:

nota: Escusam de me convidar para avaliar de novo a (in)utilidade formativa dos estágios profissionais e sua (ausência de) contribuição para o emprego. Ainda era capaz de chegar à mesma conclusão de há anos atrás, e lá se me ia o alegre optimismo suscitado por esta profunda e fina análise do nosso primeiro...

domingo, 22 de março de 2009

The times they are a'changing

País a país, através do voto e raramente com recurso a caudilhos ou a retóricas mais inflamadas que consistentes, as Américas ditas latinas têm vindo a virar à esquerda.

Esta semana, passou quase desapercebido um acontecimento com muito maior peso simbólico do que o anterior regresso dos sandinistas ao poder, na Nicarágua:

As eleições presidenciais de El Salvador foram ganhas pelo jornalista Mauricio Funes, da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional.
Sim, essa mesma. A da guerrilha dos anos 80, contra um dos regimes mais descaradamente iníquos e homicidas do continente. Frente que, entretanto, se moderou nos seus propósitos e discurso, sem que no seu centro deixem de estar a equidade, a justiça social e a dignidade.

Para um velho cúmplice das Américas, a quem hoje em dia poucos pormenores chegam do quotidiano que por lá se vai passando, a notícia provoca um razoável espanto e uma alegria imensa.

Assim à primeira vista, pelas minhas contas e deixando de fora as Guianas e as antilhas (de que, confesso, não estou a par), só a Colômbia mantém um governo da "velha guarda" direitista pura e dura. E entre os restantes só encontro, sem pelo menos um cheirinho a esquerda, o Belize e a estável democracia costa-riquenha.

Para além das alterações país a país que daí decorrem, trata-se de um quadro regional completamente novo e único.
Quem não se lembra dos tempos em que a Costa Rica era, pelo contrário, a única pincelada democrática (embora, como ainda agora, tutelada pelo grande irmão do norte), num mar de ditaduras e regimes violentamente autoritários ou oligárquicos?

Com a mudança de governos, muito mais tem vindo paulatinamente a mudar.
Sob a sua forma recentemente mais visível, talvez, na unânime tomada de posição dos governos da região contra a possibilidade de golpadas separatistas ou intervenções externas na última crise boliviana.
Conforme disse na altura, é todo um novo estatuto internacional (e toda uma nova dignidade) que a situação presente permite que a região assuma.

Esperemos que as boas intenções internas da administração Obama sejam extensivas às suas relações com o sul e que a sua detentora da pasta internacional, a Srª Clinton, seja capaz de reconverter os seus hábitos mentais a este novo relacionamento e dignidade.

De como o silêncio diz muito - 2

A novela "Provedor de Justiça", que já trouxe à baila uns posts abaixo, começa a lembrar-me a história de solidariedade portuguesa com Timor.


Antes de Stª Cruz e seu impacto mediático internacional, havia um pretendente a um trono inexistente explicando na TV que se tratava de um caso perdido por a Indonésia não se poder dar ao luxo de fragmentar o seu império, enquanto os governos e partidos só à última hora se lembravam de enfiar umas palavrinhas acerca do assunto, pro forma, nos seus programas e moções de estratégia, e os cidadãos comuns (entre os quais me incluo) pensavam em tudo menos nisso.
Subitamente, todas as instituições e figuras públicas eram apoiantes desde sempre (e sem um minuto de distração) da causa timorense e nós, populaça anónima, empenhámo-nos na mais consensual, sincera e comovente onda de solidariedade a que este país assistiu desde o pós-25 de Abril.

Desta vez, ninguém deu pelo Provedor de Justiça ao longo dos últimos anos e ninguém se preocupou com isso.
O homem acabou o mandato há 8 meses e tão pouco alguém reparou.
Agora, por causa de desavenças acerca do seu sucessor (que tem o ar de ter começado a ser discutido para aí há duas semanas, num estilo «G'anda bronca! Esquecemo-nos daquele gajo há um ano atrás!»), é uma roda viva de declarações.

Paulo Portas acorda e eleva o assunto a questão de Estado (que efectivamente é e sempre deveria ser, para além de uma questão de cidadania) e tenta passar a bola ao Presidente da AR.

O antecessor da D. Manuela aproveita mais uma para lhe chamar incompetente, dizendo que o PSD devia ter preparado uma lista de nomes inquestionáveis para o cargo. Esquece-se de acrescentar que isso deveria ter sido feito durante o seu consulado...

Porque, esclarece, «dificilmente o país teria um melhor provedor do que Jorge Miranda», donde decorre que «só por birra ou por que não se aceita uma proposta que vem dos outros é que se recusa um nome desses».

Portanto:
- Se o nosso primeiro acha que é bom, é porque é incontestavelmente bom. Ter dúvidas acerca disso é ser birrento ou mal intencionado.
- Embora as relações entre os irmão siameses PS/PSD se tenham pautado pela regra tácita exactamente inversa, é agora birrento que o mano não governante ache um bocado de mais que todos os jobs não governativos e estatutariamente independentes vão para os boys do mano que já tem o governo para brincar.

Mas o que me preocupa, de facto, não são realmente as subversões dos gentlemen agriements do centrão, ou o súbito ruído mediático.
O que me preocupa é a irrelevância a que votámos, todos nós cidadãos, a Provedoria de Justiça, ao estarmo-nos nas tintas para o silêncio que foi a sua única forma de existência nos últimos anos.

sábado, 21 de março de 2009

Rico menino!


E logo em Angola. (Mas também é verdade que bem podia ser, com acutilância semelhante, numa série de outros sítios, desde que se substituísse palavra "África" por outra...)

Ou seja, tentou apagar a calinada anterior (que de calinada só teve o não compreender que a posição expressa não é socialmente aceitável - já que da própria posição está ele bem convicto) com um apelo que é consensual para quase todos e irrelevante para os corruptos.
Afinal, nada que uma concorrente a Miss Qualquer Coisa não dissesse. Logo acrescentando, claro, desejos de paz no mundo.

Rico menino!
Só é pena ser tão feio, ou ainda ganhava o concurso.

sexta-feira, 20 de março de 2009

De como o silêncio diz muito

Soube hoje que o PS e o PSD romperam negociações acerca do futuro Provedor de Justiça.
E também que o cargo do anterior acabou há já 8 meses, sem que ninguém pareça ter dado conta disso.
E ainda (o que será menos irrelevante, já que não se trata de ignorância ou desinteresse por minudências, mas do esquecimento de uma coisa que sabia há alguns anos atrás) que quem ocupa esta função teóricamente essencial à cidadania é Nascimento Rodrigues. O senhor da foto.

Da política (embora em segunda linha) devem lembrar-se dele.
Até talvez se lembrem - como eu - que, nalguma vaga altura, ele foi designado Provedor de Justiça. Agora que isso vos (nos) foi lembrado.
Certamente não se lembram dele no exercício do cargo - que, por nada ter de vinculativo, depende totalmente da sua visibilidade pública.
E provavelmente lembrar-se-ão dos seus antecessores, mesmo que num caso ou outro.

O que coloca sob os holofotes uma questão bem mais importante do que saber quem é o senhor que se segue.
Acontecendo tudo o que acabei de deixar escrito, parece que a instituição Provedor de Justiça entrou em coma profundo sem que a gente se tenha sequer dado conta.

É uma figura socialmente irrelevante, apesar da sua ausência de poder de decisão? Muito longe disso!
Então, algo de errado existe, não apenas no exercício (?!) do cargo pelo seu actual ocupante, mas também na nossa relação com ele e com a nossa exigência de justiça e de cidadania.
Afinal, não só deixámos um senhor que ocupou uma instituição importantíssima matá-la de letargia, como lhe demos razão, ao nem sequer darmos por isso.

Às vezes, parece realmente que cada povo tem o governo (e as instâncias de poder não governativo) que merece.
Mas repetir essa frase brilhante, ficando muito satisfeitos com a sua sagacidade (que não é nossa) e perversidade, não é mais, afinal, do que uma segunda demissão.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Moralidades genocidas

A África do Sul, maior potência do continente, teve um Presidente que punha em causa que a SIDA fosse provocada pelo VIH, uma Ministra da Saúde que declarava o alho e a batata africana como a melhor terapia para a doença e terá um Presidente capaz de dizer em tribunal que toma duches quentes depois do sexo, para evitar o contágio.
Provavelmente, posições e atitudes como essas não serão estranhas às terríveis números de seropositivos e de mortos por SIDA no país.

A Europa, por sua vez, exporta um líder religioso que nada encontra de melhor para dizer, a caminho de África, do que considerar que o problema «não se pode resolver com a distribuição de preservativos», pois «pelo contrário, isso só irá complicar a situação».

Já se levantou um coro de protestos, e com toda a razão.
Afinal, como dizia o falecido Abade Pierre, se o sexo fora do casamento é um pecado aos olhos a igreja católica, é criminoso juntar a esse pecado um homicídio.

Sabendo-se que o apelo à abstinência sexual nunca será eficaz em África, tal como não é em qualquer outro lugar do mundo, a absolutização (e generalização aos outros) de um princípio moral que não é sequer cumprido pela esmagadora maioria dos católicos constitui, no quadro presente, mais do que uma imbecilidade. É um crime.

E no caso africano, dadas as elevadas percentagens de infectados, é um apelo ao genocídio.

domingo, 15 de março de 2009

Poetas escondidos

Há muitos anos que nutro um enorme respeito e ternura pelo autor deste livro.

É um homem cheio de bonomia e afabilidade, que o tornam numa óptima e simpática companhia. Mas o comportamento jovial e brincalhão disfarça uma outra característica que sistematicamente observei. As suas atitudes e comportamentos seguem de forma rigorosa, embora expressa com modéstia e naturalidade, uma ética pessoal exigente e assente em pilares que muito valorizo.

Há dias, fui surpreendido pelo seu convite para o lançamento (ontem) deste livro, pois nunca tinha ouvido falar desta sua faceta.
Bonita festa que foi...
E a evidente alegria e orgulho das muitas pessoas presentes era, também, a não menos evidente demonstração do quanto ele lhes tinha dado, antes de lhes dar estas páginas.

Chegado a casa, li o livro.
Gostei.
Mas, de certa forma, pouco interessava o valor estético daquilo que ali encontrasse.
Porque, por vezes, o mundo fica mais rico, apenas por registar as palavras de algumas pessoas boas.

PS: a foto da capa é do autor do Fotojornalismos.

sábado, 14 de março de 2009

Calimeros sem criatividade

Confrontado com uma manifestação enorme, desta vez com carácter geral e não apenas sectorial, o nosso primeiro não arranjou nada de melhor para dizer do que acusar a CGTP de ser instrumentalizada pelo PCP e BE.

É verdade que o PS, ao contrário dos seus congéneres europeus mais antigos, sempre viu os sindicatos como antagonistas e não como parceiros, ou mesmo fontes de legitimação.
É verdade,também, que este secretário-geral partilha muito pouco da cultura social-democrata, mesmo que vaga e mitigada, que por lá se descortinava até tempos recentes.

Mas, raios!... Ir desenterrar esse velho lugar-comum como argumento político?
Que coisa tão semelhante à sua licenciatura, ou aos projectos que assinou e não fez!

Entretanto, ouvi ontem numa televisão que o homem não entregou declarações de impostos durante 4 anos.
Não encontro nada no site do Público. De que será isto sintomático?

(conforme lá indicado, a imagem foi roubada daqui)

sexta-feira, 13 de março de 2009

Incoerências albinas

Estava eu quase a dormir em cima do computador, enquanto pesquisava no Google citações dos meus artigos mais recentes (o que a gente tem que fazer para redigir um relatório com os items que são exigidos hoje em dia, meu deus!), quando fui dar de caras com o Blog do Albino Incoerente.

A "culpa" foi de um link que ele fez para - adivinharam! - o "Gémeos, albinos e prisioneiros desaparecidos: uma teoria moçambicana do poder político".
Mas, como diria o nosso primeiro, foi «porreiro, pá». Com a vantagem suplementar de esse blog ser quase uma base de dados para tudo o que se escreve acerca de albinos.

Para além da referência, deixo uma foto da tigra albina do Zoo de Lisboa, para a colecção do seu autor.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Climate Change ao poder!


Às vezes, a gente passa pelos jornais on-line e dá com notícias boas.

O Prémio Universidade de Lisboa foi esta ano atribuído a Filipe Duarte Santos, um pioneiro na investigação das alterações climáticas, amplamente prestigiado nacional e internacionalmente.

A notícia dá conta do seu percurso e das boas razões que existem para a atribuição deste prémio.
Mas há uma coisa que talvez o júri e quem fez a nota de imprensa desconheçam:
O galardoado é um cientista "duro" com uma grande abertura de espírito às ciências sociais e "atrevido" nos desafios que aceita.

É assim que, por exemplo, aceitou a proposta que a Luísa Schmidt e eu lhe lançámos para, no âmbito de um projecto que conta com uma forte equipa do ICS, desenvolver cenários de impacto conjunto, sobre a erosão costeira, das alterações climáticas e das práticas locais de uso da costa - integrando nos modelos, portanto, variáveis sociais precisas e localizadas.
Assim à primeira vista, até pode não parecer nada de especial. Mas é um muito inovador salto na abordagem dos problemas de erosão, que lhe exigirá uma enorme dose de mestria e criatividade.
Muitos outros ter-se-iam resguardado de desafio exigente como este, de um risco que não precisa de correr; ele aceitou.

Fico muito satisfeito com este merecido prémio, Filipe.
Um grande abraço e até ao nosso desafio comum!

terça-feira, 10 de março de 2009

Momento humorístico na AR

«PS, PSD, CDS-PP e PCP destacam esforços do Presidente angolano para a paz e democracia»

Começo a perceber as razões do voto de pesar pela morte desse grande pacifista e democrata, o cónego Melo.

Tiraram a noite para me envergonhar


Fiquei a saber, durante o passeio higiénico da cadela, que o clube da minha simpatia podia afinal fazer pior que os 5 golos sofridos em Alvalade.

Foram a Munique apanhar 7 a 1...

Tendo em conta que no campeonato cá do burgo só estão a 4 pontos do primeiro, começo a perguntar-me seriamente se não me terei mudado para o Lichtenstein sem dar por isso.

Migração, Saúde e Diversidade Cultural


Chegou-me há poucos dias às mãos o livro Migração, Saúde e Diversidade Cultural, organizado por Elsa Lechner e de que podem ver as primeiras páginas aqui.

Embora tivesse assistido a várias das comunicações que lhe servem de base, tem sido um prazer ir saltando de capítulo em capítulo, à medida da minha disponibilidade e interesses.
Não é por lá ter um artigo (disponível aqui) mas, meus caros, está-me a parecer um livro essencial para quem se interesse por estas temáticas.

Avisarei, quando souber a data e local do seu lançamento.

Citações de café (17)

COPO VAZIO, OU A TRANSBORDAR

Esta, só é uma conversa ou situação quotidiana na medida em que também o são as anedotas contadas por esses cafés.
Neste caso, poderíamos também chamar-lhe uma "teoria popular da lógica socrática".

Alguém se queixa a José Sócrates: «Vê o que está a fazer ao país? Agora, até estudantes universitárias têm que se prostituir para pagarem as propinas!»
«Nada disso!», responde o nosso primeiro. «Como vê, eu governo tão bem que até já as prostitutas vão para a universidade.»

domingo, 8 de março de 2009

As costas largas de Adam Smith

Mais de um ano depois de o porta-voz da Frelimo ter dito que as manifestações populares de 5 de Fevereiro, em Maputo, tinham sido «atípicas e com origem numa mão invisível, que fracassou nos seus intentos de desestabilizar o País», o fantasma de Adam Smith volta a assombrar o discurso político em português.
Referindo-se aos recentes assassinatos do CEMGFA e do Presidente da República, o ministro da defesa da Guiné-Bissau acusou «mãos invisíveis» de quererem «decapitar» o país.

É claro que há duas belas vantagens nesta acusação.
Se as mãos culpadas são invisíveis, não são as nossas, nem das restantes figuras bem visíveis, públicas e respeitáveis.
Por outro lado, se são invisíveis, é compreensível que a gente não as consiga descobrir e que os crimes fiquem impunes.

Mas é curioso, mesmo tendo a desregulação neo-liberal ficado com o rabo de fora em Wall Street, que as coitadas da oferta e da procura sejam acusadas de homicídios políticos.
Entretanto, também é verdade que, cruzando-se neste caso dúvidas acerca do narcotráfego em que meio mundo estará envolvido, até pode ser que a metáfora económica utilizada pelo Sr. ministro tenha bastante justificação. Seria essa forte acusação que ele tinha em mente?
Nãã...

Em Portugal, entretanto, o nosso primeiro prefere as metáforas mafiosas às económicas, quando se confronta com acontecimentos indesejados.
Surgindo à tona de água suspeitas de corrupção, ou pelo menos de favorecimento ou decisões legitimamente suspeitas, durante o seu consulado como ministro do ambiente, não fala de «mão invisível», mas de «mão negra».
Assim mesmo, tipo Camorra.

O que, convenhamos, também é uma expressão um bocado mal escolhida e invocadora de associações indesejadas pelo próprio, se tomarmos em conta que o nosso primeiro pretende, com ela, desvalorizar suspeitas de comportamentos que, na linguagem popular, caem sob alçada da palavra "mafiosos".
As implicações desta expressão da «mão negra» são, por outro lado, também um bocado chatas na boca da 3ª figura do Estado, responsável pelo poder executivo.
Porque, embora parte da acusação caia sobre os jornais (velho clássico do discurso político acossado, mas que pelo menos ataca uma parte da fantasmagórica "sociedade civil"), o grosso cai sobre o sistema judicial.
Temos, assim, um primeiro-ministro a chamar mafiosos aos juízes e procuradores, tanto nacionais quanto da terra do muito amigo Labour Party. A desacreditar o Estado, afinal.

Enfim... Talvez os políticos que falam em português devessem começar a procurar metáforas com pés, em vez de mãos, quando o mundo não corresponde aos seus desejos.
Porque parece que foi com os pés que foram pensadas e escolhidas estas metáforas de mãos «invisíveis» e «negras».

Roubaram-me as pintinhas!

Anda um homem um ano a, arduamente, coleccionar pintinhas em 80 países do mapa-mundi para chegar aqui o fornecedor do serviço e me meter a coisa a zero!
«Não se preocupe, que as suas bolinhas vermelhas do ano anterior ficam em arquivo, para matar saudades», dizem eles.
Pois sim! Então isto é lá imagem que se apresente?
E depois, são enganadores. A gente clicka e não see nada.

sábado, 7 de março de 2009

Já não se pode mandar um político «p'ró caralho»...

Andam jornais e televisões a fazer um grande alarido porque um deputado da Assembleia da República insinuou que outro tinha interesses económicos no assunto que estava a ser debatido, tendo este (o menino na imagem) mandado o orador «p'ró caralho».

Pudicamente, as legendas televisivas - que se tornaram necessárias por a gravação de som ser má - apenas diziam «Vai p'ró c.......», enquanto os jornais se referem a «um palavrão».
Mais pudicamente ainda, foram de pronto pedidas desculpas (embora não ao representante popular enviado para penianas paragens) e, facto que julgo ser único e de duvidosa legalidade, retirada a frase das actas da AR, onde fica registado tudo o que se diz no hemiciclo, por muito irrelevante ou bronco que seja.

Quem se dê ao trabalho de reler essas actas (como eu fiz em relação a um período relativamente curto da nossa história recente) divertir-se-á perdidamente, ao encontrar os insultos mais escabrosos e ao constatar o profundo conhecimento (e por vezes utilização criativa) que os representantes da nação demonstravam ter do vernáculo português.

É verdade que o uso parlamentar dos palavrões nunca chegou, pelo menos na época que li, ao humor refinado daquela troca de palavras entre a saudosa Natália Correia e um deputado que, na primeira discussão de uma lei de despenalização do aborto, defendeu que o sexo só se deve destinar à reprodução. Perguntou-lhe a poetisa: «Então, Vossa Excelência só uma vez fez truca-truca». «Não - respondeu o homem - Eu tenho dois filhos». «Então, Vossa Excelência fez truca-truca, truca-truca».

É verdade, também, que este homicídio sócio-intelectual teria muito menos piada se a senhora tivesse dito «foder», em vez de «truca-truca».
Mas até nas utilizações insultuosas de palavrões se descobre pontualmente, lá nas actas da AR, uma boa dose de humor. Tal como se descobre (os nomes ficam registados) que o vernáculo parlamentar é transclassista, transpartidário e abrange desde pessoas que pouco estudaram até professores catedráticos.
O que, convenhamos, não deixa de ter o seu interesse histórico para as gerações vindouras...

Tão pouco estão ausentes do hemiciclo piadas brejeiras quase infantis. Como quando o seu então presidente Mota Amaral, apesar da imagem puritana e quase ascética que projecta, não evitou acrescentar, ao colocar à discussão ou votação um qualquer artigo 69, «Sessenta e nove… curioso número».

Perante estes hábitos e antecedentes, o actual sarrabulho politico-mediático e esta auto-censura a posteriori justificam, portanto, que pensemos um pouco no assunto.

Esta boa gente da população parlamentar passou, de repente, a ser recrutada entre os linguisticamente mais contidos membros das várias classes e camadas sociais?
Passaram a ser-lhes exigidos – e aos jornalistas – elaborados cursos de boas maneiras para terem acesso às suas funções?
É por isso que um parlamentar «Vai p’ró caralho» se tornou genuinamente insuportável para os seus ouvidos e sentido de sociabilidade?

Ou será que, enquanto representantes da nação, passaram a temer que a nação não se sinta representada por quem profere tais impropérios?

Ou será, ainda e pelo contrário, que passaram a considerar que comportamentos como aquele que está a ser tão discutido são demasiado “populares” para representantes do povo - implicando essa ideia que deverão projectar, enquanto grupo e independentemente das suas filiações partidárias (pelo menos desde que “respeitáveis”), uma imagem de esclarecidas elites intelectuais e morais, segundo os critérios dominantes que imaginam ser os das elites sociais?

Não constando que a primeira hipótese seja verdadeira, passemos às restantes.

A segunda hipótese lógica (por muito louvável que fosse à luz dos princípios de uma democracia representativa) também não tem muito por onde se agarrar.
Se os palavrões e esta forma peculiar de reagir/argumentar contra aquilo que se considere ser um ataque pessoal podem ser popularmente considerados “de tasca”, não só há cada vez menos tascas e as que existem perdem cada vez mais a sua importância enquanto espaços significantes de sociabilidade e cultura, como esse rótulo tasqueiro não corresponde à realidade.
Gritada ou sussurrada entre dentes, trata-se de uma frase/reacção argumentativa em que 97,5% dos portugueses se reconhecem nos sítios mais diversos (desde o lar doce lar até ao emprego e ao chefe), apenas com o senão de 53,5% deles ficarem surpreendidos por não se seguir a isso uma cena de chapada ou, de preferência, um muito nacional «agarrem-me, se não eu vou-me a ele(a)».
Para mais, essa vasta maioria terá tendência a gozar com os restantes 2,5% que não conseguem recorrer ao vernáculo sequer quando martelam um dedo e que se arrepiam quando outros o fazem.

Pode ser, então, que a coisa tenha a ver com a terceira hipótese. Relembrando, com a tentativa de um grupo heterogéneo, com acesso a instâncias de decisão e poder mas que só em raros casos é formado pelos elementos mais brilhantes, “bem instalados” ou “bem formados” da sociedade, de legitimar a sua posição de proximidade ao poder apresentando-se como uma elite “bem formada” segundo os critérios dos “bem instalados” – o que, entre as camadas sociais intermédias (no vulgo pseudo-científico, “pequena-burguesia”) faz desconfiar também de que serão brilhantes.
Ou, numa linguagem menos precisa mas mais estimulante, um saco de diferentes gatos que se “armam aos cágados” a partir daquilo que imaginam que os cágados serão, para se justificarem, enquanto grupo, como os melhores (porque mais cagadais) representantes dos outros gatos.

A hipótese parece-me tão evidente que tenho até dificuldade em argumentá-la. Talvez isso possa ficar para a caixa de comentários.

No entanto, o assunto arrasta outras dúvidas e questões.
Será que estou a ser mauzinho e que a frase «vai p’ró caralho» é pior que tantas outras já utilizadas naquele local, por isso tendo suscitado, afinal, estas reacções?

Bem… eu li-a por várias vezes em comentários parlamentares do passado recente. Pode até dizer-se que é a mais tradicional e menos criativa das frases utilizadas em situações semelhantes – ou, até, quando os deputados sentem que foram insultadas as posições do seu partido, e não eles próprios.

E temos que concordar que, assim como assim (e embora a frase tenha algum travo homofóbico quando dita a homens, e marialva quando lançada a mulheres), sempre é menos desagradável do que atribuir profissões pouco respeitáveis às mães dos oponentes, ou mandá-los «para o raio que os parta» - o que, não contendo embora palavrões, é afinal o rogar de uma praga e um desejo de morte.
Claro que quem manda alguém «para o raio que o parta» raramente está a desejar a morte, ou à espera de que a sua praga se concretize. Está mais a, para além de desabafar um antagonismo e desagrado, mandar o outro desaparecer, dar uma volta, sumir-se. Tal como, afinal, quando o manda «p’ró caralho».

Vista a coisa por este prisma, trata-se de facto de sentimentos (e sua expressão) pouco consentâneos com a cultura democrática que deveriam perfilhar os representantes eleitos para uma instituição que se legitima, precisamente, pela democracia e consequente coexistência de diferenças.
Mas duvido muito que tenha sido este tipo de leitura semiológica da coisa que, emergindo subitamente, tenha levado a tanto burburinho.

Tanto mais que, em termos mais gerais e para mal dos pecados de deputados e governantes, a possibilidade de irem «para o raio que os parta» (ou, se preferirem, «p’ró caralho») é um aspecto fundamental da legitimidade dos cargos que ocupam. Embora, claro, sendo mandados para esses sítios (ou para a reforma, dourada ou não), pelos fantasmagóricos eleitores, e não directamente pelos seus opositores directos.

Ou seja, podemos jocosamente dizer que qualquer tentativa de impedir que se mande um deputado ou governante «p’ró caralho» é intrinsecamente antidemocrática – mesmo que seja outro deputado a fazê-lo, já que também ele é eleitor.

Mais a sério, podemos achar ridículo que novas preocupações de imaginada respeitabilidade façam de uma barrasquice parlamentar um assunto de primeira página e de diplomacia inter-partidária.

Mas não podemos aceitar que, para dar vazão a essas preocupações e às motivações que lhes estejam por detrás, se censurem as barrasquices das actas parlamentares.
Se acham a questão assim tão importante, mudem-se a vós próprios. Não tentem fazer desaparecer a história no próprio dia em que ocorre.

É a crise!

O governo só tem pequenas obras para inaugurar em ano eleitoral!

Leitura imediatista: a crise está a pôr em perigo o regime e as suas mais essenciais tradições.

Leitura processualista: anda por aí uma grande incompetência e falta de planificação.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Zimbabwe Blues

No dia em que Morgan Tsvangirai sofreu um acidente automóvel que vitimou a sua esposa (jo no credo en las brujas, pero...), aqui fica a reportagem de Madam & Eve acerca do recente e faustoso aniversário do "presidente" Mugabe, no seu país faminto e em ruínas.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Eu só estou bem...

As coisas boas da vida familiar e as aulas limitam bastante esse feeling, mas sinto-me um bocado assim.
Porque embora o que os outros vêem, no meu trabalho, seja o resultado do espremer da esponja, o que me dá nele maior prazer é a fase em que a esponja absorve.
Manias...

Mas, talvez, uma boa desculpa para revisitar o Estou Além, do António Variações.

Mais um antropoblog

Nasceu esta noite um novo antropoblog: o Antropolíticas.

É prioritariamente dirigido aos meus alunos do ICS e da FCSH, enquanto espaço de informação, encontro, debate e esclarecimento que sirva de apoio às cadeiras.
Mas está aberto a toda a gente que se interesse pelos olhares antropológicos acerca do político.

Se for esse o vosso caso, vão passando por lá de vez em quando.
Eu, pelo menos, tenho aprendido muito e questionado muita coisa, nos contactos com os meus alunos.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Só um arrufo entre amigos...

Na Guiné-Bissau, o Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas foi ontem vítima de um atentado à bomba e, esta madrugada, o Presidente da República foi assassinado por militares na sua residência.
O porta-voz do exército sugeriu que o ataque a Nino Vieira foi feito por militares próximos de Na Waie, o assassinado da véspera, como retaliação. O que pode ou não ser verdade, mas que o Público já toma por dado adquirido nesta notícia, talvez julgando que isso dos exércitos são, em todo o mundo, estruturas hierarquizadas numa única linha - e nunca um entrecruzar de grupos de interesses que só têm de comum com militares o facto de terem fardas e armas, podendo por isso dedicar-se a toda uma série de actividades mais lucrativas.

O realmente curioso nessa tal notícia é, contudo, o facto de as «chefias militares» (quais?) terem distribuído um comunicado a dizer que não havia nenhum golpe de estado.
Está certo que mataram o Presidente da República. Mas «irão respeitar os poderes constituídos e dialogar com o Governo» - ou seja, o Governo vai ter que negociar com eles para continuar a existir e se encontrar uma solução.

Então, não será bem um golpe de estado; será assim mais a modos que um assassinato dialogante do chefe de estado. Ou, talvez, uma forma de comunicação um pouco mais assertiva...

Uma das coisas mais peculiares neste caso é que, num certo sentido, isso até pode ser verdade.
Pode ser que tudo tenha simplesmente a ver com o controle do tráfego de droga e do acesso aos restantes recursos, e que os cargos ocupados pelos defuntos sejam secundários em relação ao que de facto esteja em jogo.

Outra das coisas mais peculiares é que isto é também expressão de uma ideologia que talvez não seja tão nova assim, mas se está a tornar mais evidente em vários países africanos, à medida que o tempo passa e que vão emergindo alternativas políticas aos antigos movimentos de libertação: o suposto direito dos libertadores a, por o terem sido, para sempre mandarem no país respectivo e se apropriarem dos seus recursos.

Só isto explica a recente moda dos "governos de unidade nacional", por si presididos, quando os "libertadores" perdem eleições, ou a extraordinária complacência regional para com tudo o que sucedeu no Zimbabwe.
Mas num país como a Guiné-Bissau, onde acabou por haver uma ruptura entre o movimento de libertação e as forças armadas que se continuam a representar como libertadoras, e em que mesmo estas se fragmentaram em rivalidades entre grupos de interesses muito pouco militares, as lutas de legitimidade podem, de facto, acabar por se assemelhar bastante ao mero banditismo.
Ou, se quiserem, a um mero arrufo entre amigos.