Reunida hoje em cimeira excepcional, em frente do cozido à portuguesa de domingo que excepcionalmente incluia morcela de mel vinda directamente de Bragança, a família Sousa decidiu "criar condições para pagar a curto prazo" os calotes que deve às várias empresas do bairro.
Já se ouviam zunzuns acerca do assunto, desde que o Costa da fabriqueta de velas da esquina ao fim da rua tinha ameaçado despedir produtores de cera nos ouvidos se tivesse que lhes subir o salário mínimo, que o Silva do talho tinha dito que, com os calotes dos Sousas, não havia negócio que aguentasse no bairro, e que o próprio patriarca Sousa tinha reconhecido, ao mandar abaixo um abafado a crédito lá por volta de sexta-feira, que os donos do talho, da mercearia, do café, da boutique, da retrosaria, da loja de fancaria, da casa de meninas, da sapataria e do minipreço (para não falar do canalizador por conta própria e do trolha reconvertido em empresário de mão-de-obra importada) tinham razões de queixa dos calotes familiares.
Agora, segundo anunciou o genro do velho Sousa à hora da bica com cheirinho na tasca do Asdrúbal, a família há de arranjar maneira de os calotes serem pagos. E jura pelas alminhas que os calotes futuros serão pagos com uma pressa do Hamilton ou do Massa, conforme os gostos - embora, nestas questões de arame, o pessoal do bairro prefira massa viva a conversas de cámones.
O Rodrigues da ourivesaria, com um calote único mas gorducho que já tinha 16 anos de idade, começou aos pulos de alegria. Os outros, contudo, ou estavam a jiboiar os respectivos cozidos ou a curtir os digestivos - tarefa árdua, já que o Asdrúbal, à conta dos dívidas dos Sousas, tinha importado lá da santa terrinha um bagaço marado que não dava saúde a ninguém.
Chato mesmo, foi a sogra do Sr. Sousa, a D. Manuela, ter entrado tasca dentro a mandar vir. "Irresponsáveis!", clamava ela, "Primeiro, aumentaram a semanada aos putos, que agora até já dá para o lanche, em vez do pirolito. Depois, não anularam encomendas de obras lá para casa, o que só benificia as economias caboverdiana e ucraniana (esta é sic, mesmo). Agora, querem pagar o que devem?"
Felizmente, por essa altura, a clientela da tasca ou estava a jiboiar, ou a vomitar o tal bagaço, ou a pensar, frente à imagem da Virgem Maria: "Será que os cámones votam no preto bonitão, ou no bimbo com a caixa-de-óculos beata a tiracolo?"
domingo, 2 de novembro de 2008
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2 comentários:
Aqui pelo Cesto resolvemos fazer uma coleta para ajudar os pobres necessitados, mas só a troco do tal bagaço mesmo marado e tudo.
O comandante, que está abstémio, prefere um poster da caixa-de-óculos beata. Se não houver, um da D. Manuela também serve.
Abraço
Vou ver o que é que se pode arranjar.
Mas, da caixa-de-óculos beata, só encontro fotomontagens sobre aquelas fotos que a Marilyn tirou nua, quando era mocinha.
As melhoras ao comandante.
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