sábado, 2 de maio de 2009

Vital Moreira foi em demanda da sua Marinha Grande...

... e houve quem lhe fizesse a vontade

Não vi a coisa.
Estava bem mais acima, descendo a avenida com a família, ao encontro do desfile. Só por um amigo, dirigente da CGTP, vim a saber na Alameda o que se passara.

Foi, claro está, feio e democraticamente inaceitável.
Mais ainda, contraproducente.
Mas foi, também, um preocupante sintoma da presente situação social e da angústia e desespero que ela suscita em quem mais a sofre.

Porque, parece-me, Vital Moreira e Vitalino Canas não têm razão naquilo a que atribuem o que aconteceu.

Para além de as organizações não serem donas dos actos de umas dezenas de pessoas que reajam de forma mais agressiva a presenças que lhes desagradem, não me parece, de todo, que Vital Moreira tenha sido insultado devido à sua longínqua condição de ex-comunista.
Parece-me que o cidadão Vital Moreira é, neste caso, irrelevante.
Parece-me até que, em geral e enquanto indivíduo, é irrelevante para a maioria das pessoas.
Poderá ter sido um brilhante obreiro da nossa Constituição de 1976 e ser, hoje, um aspirante a Vasco Graça Moura do socratismo, mas nada que suscite ódios pessoais, mesmo ao mais sectário dos velhos comunistas da Cintura Industrial que deus tenha.

Também não me parece que se tratasse de um ataque ao PS, enquanto tal.
Que se tratasse de um ataque ao governo, que é do PS, que por sua vez tem em Vital Moreira a sua cara em campanha eleitoral, já fará mais sentido.
Mas ao governo, não simplesmente por o ser, mas por gerir nacionalmente um emaranhado de crises (uma de origem internacional, outras nacionais), de uma forma que multiplica em grande velocidade os dramas pessoais e situações sociais desesperadas, e de uma forma que é vista popularmente como distribuidora de benesses aos responsáveis pela situação.

Só quem limite o seu sentido da realidade actual àquilo que chega aos ecrãs dos telejornais será incapaz de compreender o que representa, para cada uma das suas vítimas, o despedimento colectivo (envolvendo muitas vezes toda a família), salários em atraso ou o encerramento 'profilático' de empresas - sejam elas de sectores económicos 'arcaicos' ou 'de ponta'.
E que essas situações se multiplicam a um ritmo assustador, abrangendo dezenas de milhares de pessoas e localidades inteiras, ameaçando todos os que têm emprego.
Isto, a par da aparente recompensa aos bancos - e não só aos geridos de forma incompetente e criminosa, mas também àqueles que muito competentemente vão sugando, a cada um de nós, todo o dinheiro que conseguem.
Multiplicam-se as situações insustentáveis e, com elas, os sentimentos explosivos de revolta indiscriminada, que em nada precisam de estímulos politico-partidários para se expressarem.

É verdade que, após 35 anos em liberdade, é esperada numa manifestação de 1º de Maio urbanidade e tolerância na expressão desses sentimentos individuais de revolta.
Mesmo se, ainda não há tanto tempo assim, o Porto assistiu à morte de manifestantes por parte da Polícia, a mando do governo da altura.

Mas, sendo a situação presente aquela que é, das duas uma:

Ou Vital Moreira e a direcção do PS estão de tal forma alienados das terríveis condições enfrentadas por esse país fora que, candidamente, não foram capazes de antecipar a possibilidade de reacções individuais agressivas a uma sua presença, também eleitoral, numa manifestação onde é inevitável a cristalização do descontentamento e revolta com a situação actual;

Ou, então, Vital Moreira e a direcção do PS apercebem-se bem dessa evidência, e a deslocação ao Martim Moniz dos seus candidatos ao Parlamento Europeu jogou com essa possibilidade, que se veio a concretizar.

Não fazendo eu a Vital Moreira e à direcção do PS a injustiça de os considerar estúpidos, irresponsáveis ou alienados, acredito que se tratará da segunda hipótese.
E o tratamento que têm dado ao assunto reforça esta convicção.

Vital Moreira foi em demanda da sua chapada da Marinha Grande - como aquela que, há muitos anos, catapultou Mário Soares dos últimos lugares nas sondagens para o palácio de Belém.
E houve quem lhe fizesse a vontade.

8 comentários:

Hugo Besteiro disse...

Se calhar foi mais do que uma irresponsabilidade...

Mas pronto.. o que passou passou..

Ontem também escrevi sobre isto...
http://tacada.blogspot.com/2009/05/vital-e-o-sol-forte.html

Pedro Penilo disse...

Fico contente por saber que ainda há quem consiga escrever serenamente e objectivamente sobre o assunto.

Um abraço

(Paulo Granjo) disse...

Hugo: A "segunda hipótese" não era a irresponsabilidade, mas a acção deliberada.

Abraço, Pedro.

João Areosa disse...

Como todos sabemos, a vitimização continua a dar votos...

De facto, não foi bonito ver aquele tipo de insultos, embora (e uma coisa não justifica a outra) o que é que são meia-dúzia de insultos a comparar com as centenas de famílias que não têm dinheiro para alimentar devidamente os seus filhos?

Na minha perspectiva (discutível como qualquer outra) as “agressões” não foram contra a pessoa de Vital Moreira, mas antes contra aquilo que ele representa neste momento!

Aqui fica a minha dupla indignação (contra as injurias e contra as péssimas políticas sociais deste governo)!

Um abraço!

Anónimo disse...

Boa tarde
ora eu aposto na porta número dois em que o prémio é um frigorifico a cores. Pois é por agora é só especulação, mas não deixa de ser estranho. Já não via um salto para a relva deste nivel desde os tempos do João Pinto no SLB, só falta ver se alguem marca penalty.
Giro giro vai ser ver quem sempre foi contra uma adesão à Comunidade Europeia agora ir para lá ganhar a reforma. Acho que foi mais por isso que o trataram um bocadito mal, mas acho estranho que só tenha sido insultado. E atiraram àgua ao homem num dia de calor, ui isso é tão mau só de pensar nisso dá-me tremuras.
Não gosto nada de ver candidatos a um lugar na coisa publica a armarem se em vitimas, em coitadinhos mas ultimamente parece estratégia, deve ser mais barato do que cartazes, pois deixa ver, fala se do Freport e sai logo um a dizer que é vitima e que em todas as eleições é o mesmo, agora aparece um tipo com uma imagem que fáz lembrar o avô cantigas num sitio onde seria de esperar ser insultado e depois diz que a culpa é do pcp ,pois ele deve ter feito um estudo a quem causa disturbios na via publica e insulta pessoas na terceira idade já ché ché's e descoberto que são todos militantes do pcp ou que no minimo vão á festa do Avante.
Com Mário Soares resultou, mas os tempos eram outros, as pessoas felizmente mudam e a onda do coitadinho pode ser que já não dê votos mas pronto, ... depois se vê.
Parece estranho votar num senhor que é sempre vitima de alguma coisa, porque será de esperar que depois quando ele represente o país, o país se torne a vitima.
...mas este país é estranho...

Nocturna disse...

Provocadores é o que não falta por aí!
Teria sido bom não lhe fazer a vontade e não lhe molhar o fatinho nem o bigode de «Avô Cantigas" com uma garrafa de água , que deve ter custado dinheiro que o personagem não merecia que se gastasse com ele.
Mas... como dizem os brasileiros: quem procura acha.
Teve o seu dia de glória, com presença em todas as TV's, mas se calhar nem assim lá vai.
Um abraço
Nocturna

lugardexilio disse...

A web é o infinito, não chegamos para as encomendas. Tardiamente cheguei a esta sua excelente postagem! Fina e requintada ironia!
Não faz o meu género atribuir prémios a bloggers! Quem sou eu para o fazer! Se tivesse a ousadia de optar por esse tipo de percursos, não hesitaria em classificar este seu texto como a melhor postagem politica do ano.
Por negligência (ou azelhice?) não constava dos meus elos. Nem que tenha que fazer horas extraordinárias
Abraço

(Paulo Granjo) disse...

Muito obrigado pelo elogio, embora, sem falsas modéstias, me pareça um bocado excessivo.

Mas, dado o seu entusiasmo, este post transita para o arquivo dos "Best of".

Entretanto, parabéns pelo seu novo blog.
E um abraço.