quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Para compreender Moçambique, com muito prazer

Eu bem sei que pareço um vendedor de enciclopédias, mas não resisto a armar-me em serviço público e divulgar sumariamente, a quem não conhece, a anterior obra literária do João Paulo Borges Coelho, meu escritor moçambicano favorito (desculpem lá, fãs do Mia Couto e da Paulina Chiziane...).

As Duas Sombras do Rio (2003)
O meu preferido, ainda.
A guerra civil contada no Zambeze, junto à fronteira do país e por sobre a água que separa as terras do "povo da cobra" e do "povo do leão".
Quando para se ser historiador se tem que fazer trabalho de antropólogo, e se sabe contar e escrever muitíssimo bem, o resultado é este.

As visitas do Dr. Valdez (2004)
A reconfiguração pós-independência da vida e da memória, vista do crepúsculo de duas irmãs, amenizado pelas visitas que faz a uma delas, já senil, o falecido Dr. Valdez, protagonizado pelo jovem criado que cresceu na casa.
Recebeu o Prémio Craveirinha.

Índicos Indícios (2005)
Dois volumes de contos (Setentrião e Meridião) que acompanham a costa moçambicana de norte a sul. Para lá do interesse de cada conto e das personagens por vezes fascinantes e nunca maniqueístas, juntos mostram a rica diversidade do país.
Mais uma bela obra de histório-antropo-escritor.

Crónica da Rua 513.2 (2006)
Outro dos meus mais favoritos, apesar de haver quem ache lá a mais a presença de fantasmas e espíritos não metafóricos. A debandada portuguesa, a fase de transição e o imediato pós-independência, no espaço sempre público de uma rua apontada à baía de Maputo e de onde as famílias de pescadores a as peles mais escuras tinham estado excluídas.

Campo de Trânsito (2007)
Um livro corajoso mas que se obrigou a ser, por vezes, alegórico, acerca de um trauma colectivo que apenas os posteriores horrores da guerra civil permitiram secundarizar: os campos de reeducação.
É o único dos seus livros em que alguns diálogos apresentam uma característica muito comum na literatura africana em língua portuguesa: inverossimilhança. Mas neste caso, não por falta de perícia do autor, mas como instrumento da aura alegórica pretendida.

Hinyambaan (2008)
Um irónico relato da viagem de férias de uma família sul-africana, em demanda de Inhambane através do sul de Moçambique actual, com peripécias hilariantes, piscares de olhos ao quotidiano do país e visitas inesperadas.
É o mais leve dos seus livros (até pelo tema) e não sei se terá a mesma piada para quem não conheça Moçambique e os sul-africanos boeres, quando dão por si fora de água. Eu diverti-me imenso.

Esperemos, agora, pelo "Olho de Herzog"...

Sem comentários: