quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O drama dos 4.000 caracteres e dramas bem mais sérios


Pergunta: Como é que se enfiam 3 anos de pesquisa e reflexão em 4.000 caracteres?


Resposta: Não se enfiam, seu estúpido!



Embora me considere razoavelmente sintético, foi esta a resposta que descobri ontem, ao escrever este artigo de opinião para o jornal Público.
Espero que, apesar disso, seja útil a quem o leia.

Mas aconselho-vos, mesmo, mesmo, é a ler esta impressionante reportagem, feita por João Vaz de Almada na zona onde faço uma boa parte do meu trabalho, quando vou a Maputo.

Claro que o artigo principal, da Sofia Lorena, também merece bem o tempo que passem a lê-lo.



PS: Parece que o artigo deixou de estar em acesso livre. Aqui fica ele.


A RAZÃO E O SENTIDO DE DOIS MOTINS

Tal como em 5 de Fevereiro de 2008, Maputo viveu ontem um dia de barricadas de pneus ardendo nas ruas, pedradas a carros e montras, populares mortos pelas balas das forças policiais.


Também como nesse Fevereiro, o motim foi convocado em rede por SMS e boca-a-ouvido, alastrando em bola de neve de um bairro popular a outro, à medida que o fumo das barricadas vizinhas ia sendo avistado.


Como em 2008, o móbil imediato dos protestos foi a brusca subida de preços. Então, dos “chapas”, periclitantes carrinhas que servem de transporte público à esmagadora maioria. Agora, da água, electricidade, pão e arroz – sua base alimentar.


Em ambos os casos, ainda, os aumentos ameaçam as próprias perspectivas de subsistência de uma população que precisa de toda a sua criatividade e desenrascanso para, simplesmente, se manter no fio da navalha. Mas, para esses pobres, mais irritante ainda que os aumentos foi – em 2008 e, muito provavelmente, agora – verem neles uma desconsideração, por parte de quem decide, para com as suas dificuldades e necessidades mais elementares.


Moçambique passou, com o fim da guerra civil, de um regime socializante e paternalista para uma política ultra-liberal que trouxe o aumento do desemprego e das elites económicas, coincidentes ou ligadas às elites políticas. Trouxe também a erosão do controle local da população através de instituições partidário-estatais que, se podiam cometer abusos, também podiam canalizar as necessidades e reclamações populares.


O sentimento que hoje grassa nos bairros populares do Grande Maputo é o de uma incerteza global quanto ao futuro e à própria subsistência e, face ao poder político, a sensação de que as suas dificuldades se tornaram irrelevantes para os poderosos e de que não existem canais por onde as suas necessidades e protestos possam ser canalizadas de forma eficaz.


Esta situação e visão permitem que motins como o de ontem possam ser sentidos como a única forma válida de protesto. E que possam ocorrer sempre que uma nova medida política ameace a sua subsistência, enquanto vêem desfilar perante si o que consideram ostentações de riqueza e desigualdade.


Não quer isto dizer que quem protesta violentamente pretenda pôr em causa o governo ou o partido que o ocupa desde a independência.


Maputo é um baluarte eleitoral da Frelimo e a maioria dos manifestantes de ontem terão votado nela o ano passado.


Só que a visão dos direitos e deveres entre governantes e governados predominante nesses bairros populares não coincide com o hábito europeu (e das elites políticas locais) de aceitar que basta a um governo legítimo tomar decisões legais para que também elas sejam legítimas.


Estas pessoas consideram, antes, que o poder instituído não deve ser ameaçado mas, em contrapartida, tem que garantir o essencial de bem-estar e dignidade às pessoas que governa. O governante pode «comer mais», mas não «comer sozinho», à custa da fome dos outros. Assim, por muito que o poder seja considerado legítimo, uma sua decisão pode ser ilegítima, se quebrar esse dever.


Ou seja, os amotinados de ontem (tal como os de 2008) protestavam contra uma decisão política concreta e protestavam contra a forma como o poder político é exercido. Afinal, protestavam contra aquilo que consideram uma quebra do “contrato social” que estabelecem com o poder instituído a que se submetem. Uma quebra que, com a repetição de motins no essencial iguais, afirmam já não tolerar.


Claro que, a cada novo motim bem sucedido (e o de 2008 era um claro motivo de orgulho e auto-estima nos bairros pobres), mais se reforça a imagem popular de que essa é a única forma eficaz de protesto.


O que coloca o governo moçambicano perante um difícil dilema.


Ou não cede às reclamações e aumenta exponencialmente a repressão policial, arriscando o apoio financeiro internacional de que depende, ou se torna mais “tradicionalmente” africano, considerador e dialogante, fragilizando com isso as suas práticas mais autoritárias e os actuais padrões de concentração de riqueza.

6 comentários:

V. Dias disse...

Visto.

Zicomo

Luís Serpa disse...

Este artigo é de uma iditice sem fim. Dizer que em Moçambique há uma política ultraliberal desafia o entendimento de uma criança de 5 anos.

Por amor de Deus, não podem pelo menos prestar um mínimo de atenção ao léxico?

Wholesale Chanel Handbags disse...

Thank you,it is very helpful of me!

(Paulo Granjo) disse...

Caro Luis Serpa:
Se tem dados acerca das politicas economicas de Mocambique que possam esclarecer este pobre escriba e os sociologos, economistas, antropologoa e cientistas politicos que trabalharam o assunto, muito agradeco que os partilhe connosco.
Afinal, preferimos nao escrever idiotices que desafiem o entendimento de uma crianca de 5 anos...

PS: se recusa o rotulo por a entrada no mundo empresarial local precisar de ligacoes ou a entrada de socios das elites politicas, compreendo a sua posicao... Mas nao e' disso que se fala, quando se referem as politicas economicas.

Anónimo disse...

Infelizmente não é possível aceder aos artigos em questão a partir do site do Publico. Só assinantes....

Raquel

(Paulo Granjo) disse...

Na altura, estavam disponíveis.
Assim sendo, irei afixar aqui esse artigo, seguido de 2 outros que escrevi para jornais de Moçambique, de onde acabo de voltar.