terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Crónicas dos Motins - 7

QUERIDO ANÓNIMO:

Um simpático Anónimo deixou escrita, nos comentários a "Crónicas dos Motins - 4", a pergunta

«Querias os comandos a defenderem-te?»

Parece-me que a pergunta e a resposta merecem ser afixadas em post:

«Não, até porque não precisava e porque o Regimento de Comandos já não existe desde que o Fernando Nogueira foi ministro da defesa.
Queria que os serviços diplomáticos do meu país não achassem normal que, por ser feriado em Portugal, não tivessem trabalho a fazer durante uma revolta que, na altura, estava em crescendo e era imprevisível nos seus possíveis desenvolvimentos.
Queria que cumprissem a sua missão ou que, pelo menos, fingissem importar-se com os cidadãos do seu país, para além desse outro fingimento de o MNE dizer que estamos todos bem sem o saberem, sem o terem procurado saber ou nos terem deixado informá-los da nossa situação. Tal como, na mesma altura, disse que não havia portugueses no Chade quando estavam lá 5.

Iam na mesma carrinha que nós 4 portugueses de idade respeitável que, mal tinham pisado Moçambique, foram logo levados para o Kruger Park. Seguia-se a Inhaca e ninguém lhes tinha sequer dito se ainda passariam no Hotel Rovuma ou iriam directos para o aeroporto. Quase não falavam inglês, sendo conduzidos por um sul-africano que não falava português e que, compreensivelmente, queria despachar o assunto e ir para casa. O Hotel pelo menos atendeu o telefone depois de uma hora de tentativas, mas nem lhes chegaram a telefonar de volta.
Como é que essas pessoas se teriam sentido, e o que é que lhes poderia ter acontecido, se não calhasse partilharmos o mesmo transporte?»

9 comentários:

jpt disse...

Bem, como tenho alguma experiência disto [já trabalhei numa embaixada; já me assustei no estrangeiro; já critiquei as minhas embaixadas (sou cidadão português)] permito-me comentar aqui:

1. As tropas portuguesas intituladas "comandos" existem, ainda que sob designação ligeiramente diferente da mui conhecida (por razões da sua participação na guerra(s) colonial/de libertação em África e da sua participação nos processos revolucionário e democrático em Portugal) "Regimento de Comandos".
Aduzo, porque vem à baila, que em Moçambique há uma pequenissima representação de "tropas especiais" portuguesas (nas quais os "comandos" são comummente integrados): os fuzileiros, que há anos prestam assistência técnica em regime de cooperação à escola de Fuzileiros na Catembe (julgo que em delegações de três homens, mas não estou certo) e os próprios comandos que estão presentes na formação na Escola de tropas especiais (confesso que não me lembro do nome exacto) em Nacala.

Claro que nenhuma dessas missões tem qualquer tipo de mandato ou legitimidade para qualquer actividade securitária ou de intervenção militar, à excepção da referida actuação de assistência técnica (docente, formadora e, porventura - pois aqui especulo - de assistência ao nível de gestão).

2. Quanto ao sumo dos acontecimentos: as Embaixadas costumam levar porrada por muita coisa (muita merecerão, com toda a certeza, e às vezes não precisavam de merecer) mas não podem nem devem assegurar a segurança dos seus nacionais no "a quente" - isto não é nada agradável de escrever, e é matéria para crítica, mas eu aí atiraria de resposta a cena da demagogia populista. Ou seja um patrício qualquer (por exemplo, um bloguista de nome jpt) leva com uma pedra no meio da rua em momento de manifestação expontânea e quer que a sua representação diplomática o ajude ali? Lamento - ela não tem meios para isso; lamento - duvido que seja esse o seu mandato. Protesta porque isso não foi relatado com agravo aos orgãos de comunicação? Um bocado de egocentrismo, não?

Sim senhor, no dia da confusão o Consulado (feriado português ou não) devia ter aberto - alguém ficou a dormir em casa e não devia. Porrada nele sim (como no Asterix, para dentro do caldeirão!) E devia estar aberto acima de tudo para dar informações e apoio psicológico a quem o precisasse - já para não falar da porta aberta, caso necessário. Agora o resto já não.

3. Voltando ao 2. No caso de algo inesperado (o Savana "avisou" que ia haver confusão - mas não precisou a data e a hora, nem o local. E que me lembre não foi a primeira vez que os jornais moçambicanos aventaram a hipótese de haver chatices na rua a propósito de alguma matéria. Se a gente arrumasse a casa de cada vez que o fazem bem que estaríamos tramados) haverá alguns procedimentos a ter - que nós costumamos ver anunciados quando há algum conflito ou desastre natural em algum país outro. Confirmar que os nacionais residentes estão bem (e isso faz-se através da consulta dos dados oficiais, pois os nacionais residentes estão registados nos consulados - quando não estão não devem protestar que ninguém lhes liga, eles são os primeiros a não se ligarem; e através dos dados recolhidos junto de instâncias de saúde pública e de segurança (é um a posteriori, o que não implica que não seja também um durante, consoante o fluir do caso finalmente há o caso dos turistas - é bem mais difícil de traçá-los, mas neste caso há uma mescla de meios para tal, sempre insuficientes (são muito móveis os "tour"istas) - 1. o raio dos vistos, que dá uma hipótese para saber quem está aí (quem anda baldado, azar); 2. os hoteis e afins (Quem esta em casas, pois ...). Entenda-se de novo, regresso à visão a posteriori, mas mais uma vez, não obrigatoriamente nas calendas gregas... - houve algum relatório dessas instÃncias sobre cidadãos portugueses? Se nao houve como protestar o ter-se dito que tudo está bem entre-patrícios?

Agora a ideia das críticas aqui é que deveriam fazer mais num momento destes? O quê? E se sim, se muito mais, que deveriam fazer um dia (longe vá o agoiro) que haja algo mesmo muito grave? Saírem os CDs para a rua a apanhar patrícios no caminho? Repito, o consulado aberto (também é um must a gente aqui protestar com o consulado ...). O resto o quê?

4. Pois, no dia da trapalhada eu estava fora de Maputo. Também me assustei com a minha família - também lhes disse ao telefone alguns conselhos (pouco úteis dada a distância). E também lhes disse, caso fosse necessário e falhassem as outras alternativas de segurança que íamos aventando, que se dirigissem À Embaixada e de lá não saíssem enquanto necessitassem, ao que fui respondido "é feriado portuguÊs, está fechada". E também eu, lá do longe no susto, resmunguei um qualquer "filhosdaputa". A quente. A frio, nos dias que se vão seguindo, mais vale dizer de maneira diferente - ir pensando se estão aí para nos mitigarem os sustos e os riscos em todas as situações? Os turistas, azar, quem anda à chuva molha-se - e como procuram o calor dos trópicos e este é na estação das chuvas ...

5. O chade tem guerra, tem 5 patrícios. Moçambique não tem guerra, tem milhares de portugueses (15 000? 20 000?) - não há comparação para o tipo de assistência que se prepara para os nacionais.

6. o "simpático anónimo" como dizes estava a mandar uma boca. O antipático nomeado (aqui o jpt) desmetaforiza-o: "querias o Estado a defender-te"?

Esse é o ponto - o Estado que te defende aqui, e aos turistas, é o Estado moçambicano (se bem, se mal, isso é outra questão). Não há guerra, não há desastre natural (em Maputo, entenda-se), as instituições funcionam (se bem, se mal, isso é outra questão, repito). Se aqui residimos protestamos com o Estado português e com a sua representação pela forma como conduz (e medeia) o relacionamento bilateral, como defende interesses legítimos de empresas, organismos e gente. Não porque não trata no momento e in loco de nós.

7. Como vÊs o nosso distinto olhar sobre isto provém de um diferente olhar político.

8. E por falar em política, bem mais interessante do que queixar-mo-nos sobre um consulado que não abriu (e subsequentes hiperboles) mais valia pensar e dizer sobre esta coisa do PR Cavaco Silva visitar Moçambique. Após o ritual da "reversão" de Cahora-Bassa - aí sim haverá matéria para discutir se os interesses de Portugal e dos portugueses nas relações bilaterais são bem conduzidos. Não, desculpa a franqueza, com esta demagogia.

jpt disse...

Especifico "mais valia pensar e dizer ... Não, desculpa a franqueza, sobre esta demagogia"

(Paulo Granjo) disse...

Flávio:

Uma tão longa explicação merece resposta cuidadosa e argumentada. Terá que ficar para quando acabar o artigo que tenho que entregar amanhã.

Por agora, só uma curta nota:

A wikipédia também engana.
Apenas há Comandos no mesmo sentido em que eles dizem que "Um Comando morre Comando", ou seja, há gente que tirou o curso e tem direito a usar o crachá.
O regimento não foi extinto por Nogueira/Cavaco devido a uma eventual má imagem das suas participações nas guerras coloniais e no PREC (participações que, pelo contrário, foram a base para a sua manutenção durante tanto tempo), mas na sequência do escândalo provocado por mortes de recrutas em turnos sucessivos, em tempo de paz.
Se isso foi ou não uma desculpa do poder político da altura para fragilizar o mais poderoso lobby nas Forças Armadas e para desviar as atenções públicas do facto de o problema das mortes de recrutas não se limitar aos Comandos, já foram especulações cuja veracidade não posso garantir.
Com a extinção do regimento, os seus efectivos foram ironicamente integrados no Regimento de Tropas Páraquedistas (Tancos), passando portanto a pertencer à Força Aérea e não ao Exército. O grosso deles foi, depois, integrado na Brigada Ligeira Aerotransportada, também também junto com os Páraquedistas e também dependente da Força Aérea.
Se alguns dos seus quadros se vieram depois a transferir, a título individual, para as Operações Especiais (Lamego) ou mesmo para os Fuzileiros, nada há de estranho nisso, nem é relevante para a questão.

Quanto ao que realmente interessa, fica para daqui a um tempo, OK?

jpt disse...

As conversas (e melhor ainda as polemizadoras) sao como as castanhas de caju, um tema puxa o outro:
1. dos meritos da wikipedia nao sou paladino - ha tempos andou o pacheco pereira a bater-lhe e penso que com razao. Esta ai o elo por tique de bloguista (isto eh uma especie de rodape de outros contextos).
2. se os actuais "comandos" correspondem ou nao a um ideal-tipo (vai sem ironia) nao faco a minima ideia. Mas "ele ha-os" e sei-o por via do espanto - ha anos estava eu em Nacala e vejo entrar um, a tratar nao sei de que assunto. "Afinal"...?
3. Em lado nenhum aventei que o regimento tinha sido extinto por causa da guerra. Apenas salientei que a sua celebridade muito exo-castrense se deveria tanto a guerra em Africa como aos tempos dos "chaimites"
4."Quanto ao que realmente interessa" nao estou certo a que se refere - eu torco para que seja o exercicio de uma porrada substancial no mne (ou melhor dizendo, na politica externa portuguesa em Africa). Ainda que, muitas vezes, me pareca um exercicio espurio - nao ha nada a fazer a nao ser deixar escoar o fel do cansaco.

Anónimo disse...

Ó JPT:

Já que não pareces parvo nenhum, explica lá uma coisa, para este camelo que larga mil e tal euros por mês dos impostos que pagam a esses gajos e já "tour"istou por Moçambique perceber o teu primeiro comentário.

O menino já nasceu zangado com toda a gente, deve alguma coisa a alguém ou tem culpas no cartório?

(Paulo Granjo) disse...

Ó Anónimo:

Como diria o imorredoiro Diácono Remédios, «Não havia nexexidade!»

Anónimo disse...

Li uma postagem muito feia no Ma-schamba e a sua resposta.
Dou-lhe minha solidariedade, Professor.
Dizer que acho estranho que fosse preciso 9 anos para perceber quem é aquela pessoa. Eu precisei de menos que um semestre.
Não posso deixar meu nome porque ainda sou estudante e ele é vingativo.

(Paulo Granjo) disse...

Caro anónimo:

Agradeço a declaração de solidariedade mas, tendo lido o meu comentário no Ma-schamba, sabe que dei o assunto por encerrado.

Mais importante, trata-se de uma "zanga" entre duas pessoas que se conhecem há muito tempo; penso que deveria ter sido privada e não num post, mas tenho a certeza de que não pode nem deve tornar-se objecto de "claques".

Penso também que está a ser injusto(a). Se foi aluno(a) da pessoa em questão, saberá das muitas qualidades que tem, independentemente daquilo que lhe desagrade nela.

Mas, sobretudo, não tenho conhecimento de nenhum acto persecutório ou vingativo sobre alunos, pelo que considero que a sua última frase tem, até prova em contrário, contornos caluniosos.

É por essa razão (e para não estar a alimentar "telenovelas") que irei apagar o seu comentário logo que consiga descobrir como fazê-lo.

Peço a sua compreensão para essa minha escolha.

(Paulo Granjo) disse...

Caro (e mesmo) anónimo:

O JPT acha que estou a ser mais papista que o Papa, que não se justifica apagar. Sendo ele o atingido, deixemos as coisas assim - e "over and out".