domingo, 30 de setembro de 2007

Fado do Esgraçadinho, versão Canis Lupus

Joguei rugbi, na minha tenra adolescência.
Primeiro, num aproximativo clube de liceu onde os jogadores-treinadores mais velhos não se deram ao trabalho de verificar o meu ano de nascimento, pelo que tive a sorte de jogar a 3/4 ponta na equipe do escalão seguinte, em vez de andar a martirizar putos com a minha idade mas metade do tamanho.
Depois, num clube à séria, onde treinava a médio de abertura mas quase nunca jogava, por haver um outro que era bem melhor do que eu para o lugar.

Suponho que a simpatia inicial pelo jogo se ficou muito a dever às regulares transmissões televisivas do então Torneio das Cinco Nações, em que um avanço da linha de 3/4 do País de Gales enchia bem mais o olho do que 2 horas de saltos de ski, que os jogos de hóquei em que não se via a bola, ou mesmo que as anuais transmissões da final da Taça de Portugal e do G.P. do Mónaco.
Essa simpatia desenvolveu-se muito, depois, com a sua prática. Talvez pelos ventos revolucionários da altura, tinha deixado de ser uma modalidade de "betos" sobrealimentados, como dizem que de novo é. Dava gozo jogar e tinha aspectos de fair-play quase aristocrático, como o túnel que os vencidos faziam para aplaudir os vencedores (depois retribuído por estes), ou o facto de nunca ter sido aleijado deliberadamente por um adversário - ao contrário da contínua carga de pancada com que fui brindado no meu único jogo oficial de andebol.

Em suma, é um desporto que gosto muito de ver e que gostaria ainda de praticar, se existisse a um nível de solteirosXcasados e eu não me tornasse um segundo Mr. Magoo logo que tiro os óculos.
Por essa simpatia, mais me pareceu desprezível o faduncho armado em torno da participação - tirando esse aspecto, digna e louvável - dos tais de "Lobos" no mundial de rugbi.
«Para mim foi como se fossem campeões» por perderem por poucos com a Roménia? «Foram verdadeiros heróis» por marcarem um ensaio à Nova Zelândia? Haja paciência e decoro!
Uma equipe amadora comportou-se decentemente num desporto que, como quase todos, é profissional. Num desporto em que há selecções cujos jogadores nem sequer jogam em clubes, mas apenas nelas. Óptimo. E então? Embarca por isso um país na retórica dos "pobrezinhos mas honrados", das "vitórias morais", dos "Davides contra Golias", quando são 15 para cada lado e as condições ou se criam ou não podem ser criadas, mas só servem de atenuante e eterna justificação para quem se habitua à mediocridade?

Disse-se que esta campanha mundialista foi uma enorme acção de divulgação do rugbi.
Foi, sobretudo, um hino à auto-complacência e uma reedição do Fado do Esgraçadinho. A mensagem passada aos potenciais novos praticantes da modalidade foi: «Venham ser uns perdedores esforçados, com um g'anda par de tomates, uma g'anda desculpa para as derrotas e um país a apaparicar-vos».
Pode ser que aqueles rapazinhos musculados e os jornalistas entusiasmados (mesmo que não saibam escrever "talonador" ou em que é que isso consiste) se revejam neste filme, tão conhecido de outras eras. Mas quero crer que a chavalada não. Felizmente.

Se a ideia é prestar um serviço à divulgação do rugbi, mais valeria televisionarem em canal aberto os jogos finais do campeonato.Afinal, o que leva putos para o basquetebol é a beleza dos jogos da NBA. Não é a selecção nacional (profissional, elàs) a, muito esforçadamente, quase ganhar jogos.

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