Este título poderá parecer estranho, num post que tem como razão de ser o facto de Paulo Pedroso ter ganho a acção que interpôs contra o Estado português, por prisão ilegal no processo Casa Pia.
Perguntarão vocês:
Não foi reposta a justiça?
Não lhe foi dada razão?
Não foi reconhecido pelo sistema judicial que ele esteve preso durante 4 meses e meio por "erro grosseiro" e grave negligência do juiz que tinha o caso entre mãos?
Certamente.
Mas Paulo Pedroso foi assassinado politicamente naquele dia e, de caminho, Ferro Rodrigues que se solidarizou com ele.
Com ou sem esta sentença que lhe dá razão, quase toda a gente por essas ruas fora continuará a suspeitar se ele não terá mesmo feito as coisas terríveis de que foi acusado.
Para além de tudo o resto que perdeu, o seu bom nome e credibilidade nunca serão os mesmos.
Muita gente estará mesmo, neste momento, a vociferar contra a "justiça para os ricos e poderosos", como se o problema não fosse a falta de acesso dos pobres e sem poder ao reconhecimento de que foram tratados injustamente pela justiça, mas o facto de ele o ter conseguido.
E tudo isto aconteceu com base em provas tão irrefutáveis como ser reconhecido numa foto de má qualidade e em condições pouco claras, ou em ser escutado telefonicamente a chamar "menina" a um marmanjão de voz grossa, com quem manteve uma conversa cifrada.
("Marmanjão", lembre-se, que era a namorada dele e conversa que era cifrada por ter a ver com jogatanas eleitorais dentro do partido respectivo. Mas também essa ideia de que, sendo suspeito de homossexualidade seria suspeito de pedofilia, nos diz coisas curiosas.)
Posto isto, os tribunais reconhecem que um colega foi, no mínimo, grosseiramente incompetente e deu cabo da vida ao homem, o Estado paga umas lecas à vítima (muitas ou poucas, depende daquilo que se avalia) e tudo como dantes, quartel-general em Abrantes.
O juiz em causa até pode ficar com uma mancha no curriculo e ver as suas promoções atrasadas mais uns tempos, mas continuará com o poder de decidir da vida de quem lhe caia nas mãos (que podemos ser eu ou você), com toda a possibilidade de repetir "erros grosseiros".
Para isso existem os recursos para os tribunais superiores, dir-se-á.
E com razão.
E ainda bem.
Mas não é extraordinário que o sucesso de um recurso se baseie quase sempre na demonstração de erro grosseiro ou de vício processual, em ambos os casos incompetências técnicas que, em qualquer outra profissão que não a de juiz, levaria ao imediato despedimento de quem as cometesse?
E não é extraordinário que isto seja considerado normal?
Paulo Pedroso conseguiu ver reconhecida a injustiça de que foi vítima e conseguiu ser (muito parcialmente) compensado dela. Fico muito satisfeito.
Mas quantos milhões não o conseguiriam?
Entretanto, claro, o Ministério Público vai recorrer da sentença.
Não vá a coisa pegar.
2 comentários:
Olá Paulo,
Ontem estive a ver a entrevista de Paulo Pedroso na SIC e fiquei a pensar precisamente o mesmo. Independentemente de ele ser culpado ou inocente o estigma social ao qual irá estar sujeito vai acompanhá-lo para o resto da vida.
Aquilo que é extraordinário é que o juiz que deu ordem de prisão apenas se limitou a dizer: “não comento as decisões de outros colegas”!
De facto, é revoltante que qualquer profissional possa ser condenado, por acto ou omissão, enquanto os senhores juízes, independentemente dos erros que cometam, se escudem na imunidade que a profissão lhes confere. Isto foi algo que nunca consegui compreender. É no mínimo imoral e insultuoso para as restantes profissões!
PS - Bem-vindo ao nosso “rectângulo de perplexidades”! Temos de voltar à nossa discussão sobre o risco...
Um abraço!
Um dia destes, João. Um dia destes.
Por enquanto, o regresso não está fácil, com tudo o que há a tratar de coisas acumuladas ou para o futuro próximo.
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