sexta-feira, 10 de julho de 2009

As mentiras da verdade aeronáutica

Ouvi hoje no telejornal um senhor dizer, com uma voz colocada para soar tranquilizadora, que não devem existir preocupações de viajar em aviões, mesmo quando a Gripe A atacar com força.

Dizia o tal senhor que os aviões comerciais estão equipados com filtros de ar condicionado capazes de filtrar partículas tão pequenas como a maioria dos virus.

O que é verdade.
Esqueceu-se contudo de acrescentar que, desde que se generalizou a proibição de fumar em aviões (e para poupar em combustível), primeiro deixou de se fazer renovação de ar a partir do exterior e, logo depois, deixou até de se fazer recirculação do ar interno. Ou seja, os tais filtros existem mas nada por lá passa. Isto em praticamente todas as companhias e mesmo em voos transcontinentais.

Ou seja, ainda, viajar de avião é hoje (por razões economicistas e á custa de uma suposta protecção da saúde pública) o mesmo que estar fechado durante horas numa casa hermética, a respirar o ar respirado por toda a gente que estiver lá dentro.

Apelo a duas coisas:

- a que algum membro de uma tripulação aeronáutica desminta o que acabei de escrever, se tiver "lata" e dados para isso;

- a que seja rapidamente produzida legislação, nacional e transnacional, que obrigue as empresas aeronáuticas a acabarem com esta prática que, já antes da ameaça pandémica, era um atentado à saúde pública. E que controle estreitamente o seu cumprimento.

2 comentários:

Relógio Adiantado disse...

Senhor Paulo Granjo, já venho a seguir o seu blog há algum tempo, e custa-me que o meu primeiro comentário seja num tom a roçar o reprovador...não sei qual foi a sua fonte mas procurei e encontrei o seguinte artigo do NYTimes, onde é discutido o risco de contágio da gripe A a bordo de voos comerciais: o link é http://consults.blogs.nytimes.com/2009/05/02/flu-risk-and-airplanes/

O artigo é de Maio, pelo que é bastante actual, lá, um tal de Dr. Mark Gendreau diz: "traveling by air remains safe. I would have no hesitation in flying or having one of my family members fly.

Air circulation patterns aboard standard commercial aircraft are side-to-side — a so-called laminar pattern — with air entering the cabin from the overhead, circulating across the aircraft in a circumferential manner and exiting the cabin near the floor. Studies published in 2004 confirmed that little to no front-to-back, or longitudinal, airflow takes place. This air circulation pattern compartmentalizes the airflow into sections within the cabin, thereby limiting the spread of airborne particles throughout the passenger cabin."

(Paulo Granjo) disse...

Antes de mais, muito obrigado pelo seu comentário.

Espaços como este só são úteis (para além de, eventualmente, alimentarem o ego dos "donos" dos blogs) se estimulam o debate, a transmissão de experiências e, com sorte, algum aprofundamento mútuo. O que é muito difícil se os intervenientes tiverem experiências e opiniões semelhantes, limitando-se a dizer "amen" uns aos outros.

Entrando na questão, gostaria antes de mais de chamar a atenção para o facto de, perante qualquer problema de segurança pública que envolva actividades e interesses financeiros de grande monta, há sempre peritos tecnicamente habilitados que se pronunciam a favor da inexistência de perigos significativos por parte dessas actividades.
E não têm que "estar comprados", que ter conflitos de interesses, ou sequer que estar a mentir.
Podem fazê-lo por convicção técnica e cultura profissional.
E podem (como no caso cujo link envia, ou no caso do perito que ouvi na televisão) estar a falar verdade, embora apenas parte da verdade.

Os filtros de ar condicionado dos aviões são do melhor que há e o sistema de renovação externa de ar funciona como é explicado no artigo que refere.
Mas é preciso que seja ligado em voo - e não apenas para testes como o referido.

Ora as empresas petrolíferas notaram uma significativa redução do consumo de combustível por parte das companhias aéreas, sem alteração de aparelhos e rotas que a pudessem justificar, a partir da proibição de fumar nos aviões.
Um dado que, no caso de Portugal (e incluindo, claro, as muitas companhias que aqui operam ou fazem escala) me foi transmitido numa conversa de trabalho acerca de outro assunto.

Como havia, internacionalmente, referências pontuais ao facto de a proibição ter sido aproveitada pelas companhias para substituir a renovação de ar pela recirculação interna (o que já induziria uma poupança significativa, dada a redução da maquinaria envolvida e das necessidades de aquecimento do ar utilizado), tomei durante uns anos essa explicação como boa.

Calhou, tempos depois, isso vir a conversa com uma pessoa que trabalha como tripulante de cabine.
Olhou para mim com uma certa pena da minha ingenuidade e comentou: «Não. Nós já nem fazemos recirculação de ar. Só se a temperatura baixasse muito na cabine, mas isso nunca acontece com muitos passageiros e um avião com bom isolamento.»

Tive oportunidade, desde então, de confirmar essa informação com duas outras pessoas de tripulações de cabine e com um piloto, pertencentes a duas diferentes companhias aéreas e pouco à vontade com a conversa.

Estou, por isso, convicto de que essa é uma prática "normal" (se não generalizada), que a frio nem sequer me espanta muito, por ser semelhante a opções economicistas que encontrei noutros sectores económicos e grandes empresas.

Estou também convicto de que, constituindo ela um perigo para a saúde pública e estando instalados os mecanismos tecnológicos para limitar muito esse perigo (mecanismos cujo uso até talvez seja já obrigatório, embora se "fechem os olhos"), a situação é intolerável e terá que ser clarificada e controlada pelos poderes públicos e pelas instituições de controlo da actividade aeronáutica.

Tanto mais que esse controlo é neste caso fácil, dados os instrumentos de registo dos aviões, e que, perante a ameaça de doenças potencialmente mortais, o procedimento economicista que referi não se limita a ser imoral; é criminoso, á luz da legislação geral existente na larga maioria dos países.