quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Um silêncio emocionado

Tenho andado chocado, ao mesmo tempo que estupefacto, com diversos acontecimentos nacionais recentes.
Com destaque, claro, para os desenvolvimentos que têm vindo a público acerca da cada vez mais evidente paranoia anti-mediática do nosso primeiro, e para a naturalidade com que os ocupantes do poder político parecem encarar o uso dos meios estatais e para-estatais no silenciamento de coisas desagradáveis.

Em Itália, o magnata dos media manipulou-os, num quadro de grande concentração empresarial, para aceder ao poder político.
Por cá - onde pouca actividade empresarial de grande escala vive sem alguma (ou muita) dependência estatal ou de relações a esse nível - tudo indica, cada vez mais, que quem acede ao poder político se sente no direito de condicionar os media, através de pressões pessoais, financeiras ou mesmo por controle accionista que mobiliza os meios e poder estatal, para calar vozes e investigações incómodas, na expectativa de se reproduzir no poder.

Mas, a par desse caso, outros houve.
Talvez menos graves, mas igualmente sintomáticos de sentimento de impunidade na utilização de meios públicos como se eles fossem meros objectos do arbítrio de quem foi nomeado para os administrar, e de irrelevância, para quem decide, das consequências das suas acções.

O travo que fica na boca é mais do que um sabor a abuso na forma de exercício do poder.
É um travo de assalto e subversão (na prática) de princípios essenciais do regime em que é suposto vivermos.
Mas é uma intuição baseada em muitos e fortes sintomas; argumentável e sustentável em dados, mas demasiado grave para que tais argumentos e dados a salvaguardem de eventuais procedimentos judiciais.

E, por isso, tudo o que tenho tido vontade de dizer (para lá daquilo que aqui fica laconicamente escrito), é impublicável sob a sempre leve e curta forma de um post.

Daí o meu silêncio nos últimos dias e acerca destes assuntos.
Para o qual peço as vossas desculpas e compreensão.

2 comentários:

Anónimo disse...

LIVRA-TE DO MEDO!!
de José Afonso

(Paulo Granjo) disse...

Conforme se poderá ver ao longo das páginas anteriores do blog (ou ao conhecer-me), o medo não é um meu companheiro habitual.
E quando o sinto (como toda a gente) muito raramente me tolhe perante tomadas de posição que considere importantes.

Mas, neste post, a referência a "procedimentos judiciais" talvez tenha sido uma forma de desviar a questão daquilo que era mais essencial no meu mal-estar.
(Tanto mais que a minha irrelevância política e pública dificilmente justificaria algum processo.)

É que, mesmo antes de 6ª feira, os dados já conhecidos, juntos a outros que me foram chegando por diferentes canais nos últimos anos, configuram um quadro bastante mais grave do que o "escândalo", "tentativa de manipulação" e "promiscuidade entre poder político e económico" que toda a gente começou a clamar. E só nesse quadro fazem, para mim, sentido.

Os dados publicados esta 6ª feira, entretanto, reforçaram essa minha intuição mas ainda estão bastante aquém da situação que estou convicto existir, situação essa que representa uma subversão sistemática (e tida como natural pelos próprios) de aspectos que nos habituámos a considerar pilares essenciais do nosso 'contrato social' e regime democrático, e que será muito mais vasta quanto às práticas e às áreas da sociedade envolvidas, quanto ao número dos seus praticantes activos e quanto à sua filiação partidária.

Mas não aceito, perante mim próprio, nem falar de cór, nem fazer análises públicas sobre questões de enorme gravidade quando ainda me faltem peças do puzzle, ou não as possa provar para lá de qualquer dúvida razoável.
Como tão pouco gosto de repetir aquilo que é evidente (mas, temo bem, seja apenas uma ponta de iceberg), simplesmente para marcar presença.

Essa é, talvez, a razão mais profunda do silêncio.