ESCOLA
A citação de hoje é visual.
É uma pintura mural no Clube dos Professores («com pizaria»), em Maputo, realizada por um senhor de apelido Mabote que me dizem ter sido, na altura, desenhador textil na Coelima que deus tenha.Embora esteja datada de 2002, esse é apenas o ano em que foi refeita, a par de uma re-pintura do estabelecimento.
Já a conheci em 1999, mas tinha na altura ligeiras diferenças.
Uma das personagens que estão de costas tinha apenas duas pernas, em vez de três. E, sobretudo, havia uma vela a alumiar o livro do professor.
Não estou certo de qual era a simbologia que o autor queria transmitir - mas, a julgar pelo resto, talvez o efeito desejado fosse essa dúbia possibilidade de a vela poder representar quer o conhecimento rompendo as trevas, quer a falta de iluminação eléctrica.
Suponho que uma tal duplicidade já seria, em 2002, de um miserabilismo inaceitável numa cidade em que não possuir um 4X4 de luxo é um sinal de incapacidade para aproveitar as oportunidades que por aí correm.
Mas olhemos para aquilo que hoje podemos ver.
Reparem como só uma personagem (e aparentemente "bem casada") está atenta ao que o professor diz.
Os outros estão a "apanhar uma seca", a falar de outra coisa, a pensar na vida ou em quando poderão sair dali, a controlar o que fazem os restantes ou, sobretudo, a tentar namorar.
Num dos casos, a mulher está agradada e nos outros não. Porque, nesta parede, são sempre homens quem tenta namorar - mesmo aqueles que surgem, lá ao fundo, disfarçados de inócuas cabeças "à Malangatana" e que são bem mais do que um mero plágio estilístico.
O professor, entretanto, discorre a sua sabedoria sem olhar para ninguém, mas para um distante ponto (no espaço, no tempo e no imaginário?), para onde mais ninguém olha.
Tal como esta foto do Naita Ussene é um tratado sobre a educação sexual anti-HIV, esta pintura mural é uma aula de antropologia da educação e sobre as visões populares que a escola suscita.
Tentei, de facto, leccionar essa aula in loco, há uns anos atrás.
Os alunos devem ter achado que uma aula num restaurante ao ar livre punha em causa a sua dignidade académica.
Não sabem o que perderam.
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