terça-feira, 14 de abril de 2009

Entrolhos económicos


Pela primeira vez em muitas décadas, o custo de vida está hoje menos caro do que um ano antes, pelo menos de acordo com a forma como é oficialmente calculado.
Os juros, entretanto, estão francamente mais baixos - o que, isso sim, facilita muito a vida de quem andou mais de um ano a ter pesadelos bem plausíveis, em que os membros da família se encostavam uns aos outros debaixo de uma ponte, para se aquecerem.

A situação é curiosa porque, de acordo com a ortodoxia dos economistas (que, por exemplo, manteve os juros altíssimos na Europa, quase criando autonomamente uma crise semelhante à que importámos de Wall Street, e agravando durante meses o impacto desta última), inflação e taxas de juros têm supostamente uma relação inversamente proporcional. Ou, trocado por miúdos, quando uma baixa, sobe a outra.

Isto passa-se, claro, no mundo abstracto e nunca vivido das "leis de mercado", onde a Srª Oferta e Srª Procura são totalmente livres e racionais, tecendo ao sabor dos seus namoros e arrufos a tal de mão invisível.
Mas, se nenhuma das senhoras tem muito de racional (vejam este video e pensem no preço que pagaram, nos últimos tempos, por uma série de porcarias que compraram), tão pouco a D. Procura é muito mais livre do que um escravo recém-liberto que não tenha onde cair morto.
Se têm dúvidas, tentem lá discutir spreads com o "vosso" banco, ou forçar a compra de coisas de que realmente precisem pelo preço que consideram justo e correcto.

É por isso que se torna muito instrutivo ver que preços desceram e quais subiram.
Entre os que descem temos, claro, os combustíveis - hiperinflaccionados devido à mera especulação petrolífera e à esperteza saloia de aproveitar essa desculpa para manter os preços altos muito para além do prazo razoável. Temos também duas actividades onde os gastos de combustível são fulcrais: a pesca e os transportes aéreos.
Para além destes, temos produtos e serviços com margens de lucro e preços obscenamente altos nos últimos tempos - ou desde sempre.
O que sobe? Quase tudo o que, essencial ou não, não dá escolha - incluindo o ensino e (apesar da descida de combustíveis) os transportes terrestres, efectivamente essenciais para as pessoas.

Por outras palavras, desce fundamentalmente o que estava obscenamente caro, poderia ser objecto de alguma poupança da D. Procura e continua a assegurar rechunchudas margens de lucro à D. Oferta.
Sobe basicamente o resto, acima da inflação esperada e, em muitos casos, sem dar hipótese de escolha à D. Procura...

Um outro aspecto curioso, olhado a partir da ortodoxia económica e reproduzido pelo jornal, é que esta coisa da inflação não crescer é, afinal, um perigo para nós. Levanta o espectro da deflação.

A coisa até é explicada num boneco, de forma muito correcta e ilustrativa, de acordo com a tal ortodoxia.
Há é um problemazinho na explicação (destinada, afinal, a elucidar-nos que esta coisa de pagar menos é má para quem paga).
O ponto 2 do boneco diz «a descida dos preços e a expectativa de que vão continuar a descer tornam a poupança mais atractiva e a dívida cada vez mais cara» e o ponto 3 diz «preocupados com as expectativas para o futuro e com o crédito muito caro, as empresas adiam o investimento e os particulares o consumo».

Ó santinhos! Então vocês não repararam que os juros estão baixos, que provavelmente terão que baixar mais, e que isso não é para permitir à D. Procura continuar a ter um telhado onde se abrigar mas, precisamente, para ajudar a D. Oferta nesta curva difícil?

Já não digo que, perante uma situação anómala que põe em causa os pressupostos liberais, vocelências os questionem.
Mas, pelo menos, não debitem a conversa do costume, quando ela se torna ridícula por contrária aos dados reais.

E, senhores jornalistas, detentores da nobre missão de informar, pensem!
Ninguém vos exige que sejam economistas, antropólogos, físicos, historiadores e mais todas as outras coisas especializadas que para aí há.
Mas pensem!
Reparem quando vos enfiam o barrete. E não reproduzam a barretada.

3 comentários:

Anónimo disse...

Um dos "barretes" mais tradicionais que nos enfiam desde criancinhas é o de que o Homem é um ser racional... A mim apetece-me dizer, parafraseando o Saramago :"não é verdade que o Homem é um ser racional, quanto muito é um ser a caminho da racionalidade". Vem este desabafo a propósito deste post. Há uns 18 anos tive um curso de psicologia aplicada às vendas, made in USA. Uma semana de lavagem cerebral, mas muito instrutiva. A afirmação mais veemente do curso e que me ficou é que um acto de compra, é em 99% emocional e 1% racional. Dito de outra forma, raramente compramos algum de forma inteiramente racional, seja lá o que isso for! Compramos para nos fazer bem ao ego, para reduzir uma angústia, para agradar a uma (um) parceira(o), para exibir staus... como diria o Pereira Bastos, porque vivemos no delírio..e de vez em quando, segundo o guru do curso, lá pensamos a fundo na forma de como o porquê vamos gastar o nosso dinheiro. Também não advogo a teoria da conspiração, mas lá que o mundo está hoje como esteve sempre, nas mãos da elites. São elas que governam e se governam. Os outros, acenam que sim... Como se explica a gritante ausência de médicos nos centros de saúde e hospitais, e ao mesmo tempo não se abrem novas vagas para os muitos candidatos a medicina, que entretanto têm que ir estudar para o estrangeiro. Alguém reparou que no segundo mandato do Dr. Durão Barroso para 1º ministro, ele disse numa entrevista à RTP que não iria alterar as regras de acesso a medicina? Quem manda, afinal? Entretanto, vamos alegres e felizes vivendo na ilusão de que ao vermos os telejornais estamos muito informados. Não me convencem. Nunca perco de vista que informação é poder. Se assim não fosse, não seriam necessárias passwords nos computadores. De facto, elas só existem para impedir o acesso à informação. E a velha receita de pão e circo funciona hoje tão bem como há 2000 anos. Que racionalidade existe na criação de n estádios de futebol, com hospitais a rebentar pelas costuras? Mas vamos lá convencer os nossos concidadãos que os hospitais são mais importantes. São??? Então, e onde fica o nosso ego, o nosso delírio colectivo?! Ná, eu não vou ficar doente, em especial se ganhar o euro (ou ficar em segundo lugar, vá lá).Logo, o hospital não será necessário. Temos exactamente o país que somos e que merecemos. Se queremos ter um futuro, e viver melhor nesse futuro, é de cada um de nós individualmente que terá que partir a iniciativa. Sempre que chego a casa, aqui bem perto de Alcochete, tenho pequenas pérolas de civismos com que meditar. A urbanização é nova, e está cheia de espaço. Subretudo, dentro das pracetas, abundam lugares de estacionamento. Mas estes estão vazios, porque dá mais jeito deixar o carro à porta de casa, mesmo que estejamos a ocupar de forma ilegal e imoral a faixa de rodagem, mesmo que os outros tenham que andar a fazer chicana por entre os carros mal estacionados. Isto para não falar nos clássicos "presentes de cão", do ruído até altas horas... queremos ser desenvolvidos, com a condição que o esforço seja feito pelos outros! Temos hoje, como nunca tivemos, ferramentas para um funcionamento mais eficaz e mais igualitário do mundo. Por vezes tento imaginar um mundo em que a democracia possa ser real e em tempo real: temos a tecnologia capaz de o proporcionar, mas creio bem que nos falta gente esclarecida o suficiente para o fazer. Um tal democracia parece-me a mim ideal, mas com tais cidadãos (corro o risco de generalizar, eu sei)a mim causa-me arrepios. A igualdade com que eu sonho implica responsabilidade e conhecimento, e não sei se o "bom povo português" poderia ir por aí. Não que eu seja mais que ninguém, tento nunca perder de vista que sou filho de analfabetos. Mas para mim, carneiros, só mesmo aqueles que eu apascentei quando tinha 7 anos. Procuro nunca por a cabeça dos outros a pensar pela minha. Resta ficar atento, e tentar perceber alguma coisa do mundo. Aquele abraço

Anónimo disse...

Sou de opinião que os jornalistas não se deixam embarretar, e quem acredita nisso provavelmente acredita no coelhinho da Pascoa e no senhor de barbas com fatinho vermenho que gosta de crianças (não é o BIBI o outro... não o cruz tb n,.... é o pai natal), adiante os jornalistas gostam de ter emprego, especialmente com uma possivel recessão em que o poder de compra vai aumentar para quem não for despedido, ninguem quer ser inconveniente.O mesmo acontece com os senhores reitores, que só se fizeram ouvir para dizer que secalhar não têm guita para golosos, perdão para salários. Pois para pouco mais, e claro tendo eles formado grande parte dos senhores que se orientam nesta terriola, custa me a acreditar que o seu silencio seja inocente, o país de pantanas e o ensino superior cá da casa não diz nada, só se queixa da guita para pagar salários.
Pois axo bem pior o silencio desses meninos com emprego garantido e liberdade para falar do que de "Jornalistas" que se forem incomodativos passam a fazer parte da estatistica do desemprego.

Anónimo disse...

pois é coincidencias 10 numero redondo já foram para o desemprego
http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=132916

por outro lado

http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=132912

coelho da Pascoa né?